segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Obra de Arte

Jucilei era um pintor famoso. Pintava telas no estilo moderno, pintando paisagens, trocando suas cores e misturando lugares. A estátua do Cristo no Rio, modificando suas cores e formas, numa Torre de Piza diferente, com o seu topo no chão. O chão era coberto de diamantes. Foi vendido por uma fortuna. Mas ele tinha um grande problema: a sua namorada não gostava de arte. Marilana, uma executiva de uma empresa, achava bobagem o trabalho que ele exercia. Conversava com ele sobre ele exercer a carreira de administrador, formado por uma universidade conceituada.

Está idéia dava arrepios em sua cabeça. Após um infarto no miocárdio, aos 35, começara a exercer a pintura. Na verdade, começara com 6 anos de idade, pintando tudo. Até as próprias paredes de casa. No entanto, aos 12 anos quando conseguiria uma bolsa em um cursinho perto de sua casa, sua irmã o criticara tão severamente sobre um desenho feito para ela que Jucilei resolvera desistir. Não mais pintaria nada na sua vida. Resolveu estudar e ler. Somente fazia isso durante horas. Tinha poucos amigos na infância, menos ainda agora na sua fase adulta. Sua única amiga era Felipa que era sua empresária no ramo artístico.

Ela até conseguiria arrumar um comercial de propaganda de sandalhas para ele. Ele ficou animado e feliz com o possível cachê. Porém, após crítica severa de sua namorada, ele desistira de tentar qualquer coisa. Continuava só a pintar. Ele ficava horas e horas pintando, buscando a mistura ideal de cores para a aplicação. Comia pouco. Bem pouco. Chegara a um mês antes da exposição que o lançou para o mundo a ficar internado uma semana, pela falta de alimentação. Recuperado, contratou uma governanta para lembrar-lhe sempre da hora de comer.

Dia desses, recebeu uma ligação do escritório de sua namorada. Ela tinha se acidentado enquanto demonstrava um projeto de interligação de setores administrativos de macro-empresas. Enfiara o seu Scarpin preto, modelo 36, um número menor que o dela, e travara. Em um giro, ela torceu o tornozelo e caiu no chão. Bateu o queixo na mesa e ficou desacordada por horas. Após uma visita no hospital, ele só a procurou dois dias depois. Pintou quase que 24 horas por dia. Fez várias telas. Após isto, voltou ao hospital.

Ele levara as fotos para ela. Ela chorara. Pedira perdão e admitira que seria melhor ele continuar na carreira de pintor. Se sentira culpada e envergonhada por todas as brigas e tudo o que ocorrera. Ela pedira Jucilei em noivado. Jucilei agradecera, de maneira sincera, dizendo que esperara durante três anos por isto. Mas negou o noivado. Resolvera ficar sozinho para que pudesse se aperfeiçoar.

No fundo, Jucilei se sentira culpado. Após dois anos, resolvera procurar sua ex-namorada. Marcaram um encontro. Ele continuava famoso e ela se tornara CEO da empresa. Após muita conversa, colocaram os pingos no is. Resolveram reatar o relacionamento, muito embora Marilana estivesse saindo com alguém, mas garantira que não era nada sério. Dormiram em seu apartamento.

De manhã, acoradaram mortos. A amante de Marilana, em um acesso de ciúme, observara os dois entrando no apartamento. Matara os dois na cama de casal, colocando cada um em posição fetal, virado um para outro. E ela se suicidara no meio, após chorar compulsivamente e deixar seu rosto marcado por rímel. Ela se matara asfixiada, ficando suspensa sobre os dois. Felipa sempre desejava Jucilei. Seu relacionamento com Marilana fora uma chance de ter algo que foi dele.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Maurílio

Maurílio era um cara sagaz. Tinha somente um problema: a sua eterna inconstância. Tentara duas universidades diferentes: economia e física. Não se formara em nenhuma delas. Sua vida de inconstância o impedia de continuar relacionamentos amorosos e compromissos de longo prazo. Nunca comprava nada em carnês, pois isto já era uma forma de compromisso. Juntava dinheiro à moda antiga: para comprar algo de grande valor, juntava as notas debaixo do colchão da sua cama.


Já havia feito de quase tudo na vida, como a música do Zeca Pagodinho. Guia de turismo, vendedor, motorista, atendente, etc. O que durou mais tempo foi quando trabalho em uma grande loja de roupas sociais. Chegou a ser gerente em curtíssimo tempo, mas um problema de tendinite crônica o havia inabilitado. Apos o período legal, foi demitido. De várias conversas que tinha com seus genitores sobre a sua inconstância, ele resolvera apenas aceitar o seu momento.

Alguns momentos de sua vida, chegou a cogitar a hipótese de fazer terapia. Frequentou algumas sessões de terapia freudiana, mas como a sua inconstância o acompanhava sempre... Em três meses se deu alta. Algo que aprendeu foi aprender a ter alguma constância. Time, por exemplo, era flamenguista convicto. Uma das suas poucas constâncias. Poderia ser associado com sua fixação por adrenalina de trocar sempre por algo a sensação de que o rubro-negro sempre dá a percepção de que deve ser sofrido para conseguir algo.

Dia desses, encontrou-se com alguns amigos de colégio em um bar do subúrbio. Conversaram muito e beberam mais ainda. Tanto que nem se lembrava de nada, nem como chegou até em casa. Quando acordou de ressaca, com uma azia tamanha e de gosto azedo na boca, resolveu ir até a farmácia comprar um remédio para a tamanha quantidade de bebida alcoólica ingerida. Pensava até se teria tanto na farmácia para lhe fazer algum efeito que fosse. O seu fígado, revoltado, quase pediu demissão.

Ao chegar na farmácia e abrir a carteira, viu que somente tinha cinco reais e um bilhete de loteria esportiva. Maurílio achava aquilo estranho porque nunca apostou nunca em sua vida em nenhum tipo de jogo. Comprou o remédio e o sorveu. Resolveu passar na padaria para comer algo. No meio do caminho, encontrou uma casa lotérica. Por mera curiosidade mórbida, resolveu entrar.

Viu que o troco da farmácia tinha sido exatamente a quantidade de dinheiro para comprar o seu volante. Comprou. Não que acreditasse nisso, nem nada. Seguiu até a padaria do seu Manuel e comeu seu pão com mortadela e refrigerante na famosa pendura. Foi para casa tomar um banho. Deitou em sua cama e adormeceu. Acordou à noite, com um telefone de uma ex-namorada. Cecília era o nome dela. Ele sempre adorou o som que o nome dela fazia na boca, ao estalar a língua. Marcaram um encontro em um bar no meio do caminho das duas casas.

Cecília tinha abandonado Maurílio quando ele largou a primeira faculdade. Eram amigos de infância e estudaram no mesmo colégio. Não que Maurílio confessasse, mas aquela bela mulher branca de olhos castanhos claros mexia com o seu coração. Não que fosse de amores de fotonovelas, nem nada. Apenas atração.

Conversaram durante a noite toda. Ela explicou que o largara por um executivo de uma grande empresa, mas que havia se separado porque o relacionamento deles ficou tão burocrático quanto um processo licitatório. Conversaram. Riram.Beberam. Amaram-se durante horas na casa de Cecília.

Ao ir comprar o pão para o café-da-manhã na casa de Cecília, viu no jornal do vizinho que saíra a bolada acumulado da loteria. Ele tinha vencido. Foi para casa, aturdido. Desligou os telefones. Ficou em casa todo aquele domingo. No dia seguinte, retirou seu prêmio. Havia ali dinheiro para a vida toda, para nunca mais precisar trabalhar e continuar a sua vida fazendo o que sempre quis: a eterna inconstância de passear por onde quisesse. E tomou uma atitude.

Casou-se na Igreja com Cecília, alguns meses depois. Compraram uma bela casa. Ele montou o grande sonho de Cecília: uma fábrica de roupas, uma enorme confecção. Tornou-se pai de um filho e uma filha linda. E viajavam, duas vezes por ano.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

José - Funcionário Público

José era um homem pacto. Mais do que pacto, poderíamos definir José como um homem que não reagia a nada, nem a ninguém. Talvez seu único lampejo de proatividade na vida tenha sido passar para um concurso público de segundo grau e passou a trabalhar em um tribunal. Acomodou-se neste emprego. Nunca fizera nada mais para progredir, exceto aprender a sua função.


Sua rotina de acordar, comer o mesmo café-da-manhã na mesma bancada da cozinha, colocar as mesmas roupas das mesmas cores por dias da semana, almoçar no mesmo lugar e voltar para casa sempre na mesma hora. Jantar sempre na mesma hora, vendo tevê em seu quarto. Para não falar que ele não era um piadista (se é que pode ser chamado assim) fazia a mesma piada com a moça do caixa do almoço: - “Quanto você está me devendo?”.

Em um destes dias de semana, recebeu um cartão que dizia: “Quer mudar a sua vida? Quer deixar de ser um Zé Ninguém? Ligue!” Não tinha telefone. José achou uma péssima piada e colocou o cartão em cima da sua cabeceira. Alguns dias depois, recebeu um outro, que dizia: “Por que não me ligou, Zé?” Quase se aproximou do telefone. Mas não. Sua rotina continuava a mesma quando recebeu um outro. Este era diferente dos demais.

Era todo preto, com letras brancas, ao contrário dos outros. Ele dizia: “Zé, pode ser a chance da sua vida...” José nunca apostara em nada, resolveu apostar nesse cartão. Só Deus sabe o porquê dele, desta feita, pegou o cartão e se aproximou do telefone. Quando o retirou do gancho, uma nuvem cinza cobriu sua casa e uma figura de manto preto apareceu. Sim, se pensam que a mesma estava com uma foice, podem ter certeza disso.

José ficou pálido. Tentou gritar, porém sem efeito. A Morte levantou sua mão como que para ele parasse, e ele parou. Ela sentou em um banquinho da cozinha e lhe pediu água. Sem muito o que entender, José lhe deu e sentou ao lado dela. Após beber a água, a Morte devolveu o copo a José. Ajeitou o seu capuz, apoiou a foice em um armário da cozinha e começou a conversar com José.

Tinha uma proposta a lhe oferecer. A Morte queria tirar férias, estava cansada desse negócio de ceifar vidas. A Terra estava matando muito e ele trabalhava mais do que a Morte em outros planetas (A Morte explicou para José que preferia o termo C.A.T [Coletor de Almas da Terra]). Conversou com José para que ele aceitasse por um tempo – algo em torno de dez anos – o serviço dele. A Morte, perdão o C.A.T tinha se apaixonado por uma C.A. de uma galáxia vizinha e, após longo namoro virtual pelo MSN espiritual (com algumas quedas de conexão, mesmo sendo internet 3G), decidiram se conhecer pessoalmente.

O C.A.T ofereceu a José três prêmios que ele poderia escolher: uma esposa, mas continuar com o mesmo emprego; ser milionário e não ter esposa ou um prêmio surpresa. José indagou quando poderia dar a resposta e o C.A.T disse que teria que ser naquela hora. José resmungou, resmungou... Pensou. Deu uma última olhada no seu apartamento e suspirou. Olhou para o C.A.T. e aceitou a proposta.

Dez anos se passaram. O C.A.T volta. Dissse a José para nunca confiar em fotos de MSN, mas que tinha valido a pena porque o sexo era bom. Mas descobriu que ela era casado com um anjo torto e quase tinha dado briga. José agradeceu o trabalho dado pelo C.A.T e o chamou assim. O C.A.T falou que poderia ser chamado de amigo, já que o escolhera entre tantos outros na Terra.

José se emocionou. Nunca tinha tido um amigo. Sentiu um gosto na boca e lembrou de sua infância. Agradeceu demais ao seu mais novo amigo. Ele o abraçou e chorava. Soluçava por ter podido ter tido um amigo. Lembrou que raramente tinha companhia pra conversar e ficou muito feliz. Sua vida solitária, seu trabalho enfadonho e de tudo o que ele suportava, o que mais lhe pesava era a solidão. Seu coração ficou sobressaltado.

Ficou tão emocionado que sua respiração encurtou muito. O amigo pedia para ele se controla, mas José estava em êxtase. Gritava e chorava demais. Sentiu um aperto no coração. Cambaleou até o sofá da sala. Não sentia mais seu braço esquerdo. Estendeu a mão ao seu amigo, porém ele somente sorriu.

José compreendeu que tinha escolhido o prêmio secreto. Uma eterna amizade com alguém que lhe deu algo novo, algo que nenhuma mulher nem nenhum prêmio de loteria juntos poderiam lhe dar: uma verdadeira e eterna amizade. Neste momento, José sorriu. Ficou feliz por ter tido duas alegrias na vida: a primeira de ter sido promovido por seu merecimento como ser humano. A segunda, o falecimento de infarto fulminante de amizade.

Joana

Joana é uma trabalhadora comum. Sem muita instrução na vida, trabalha até esgotar as suas últimas energias. Sua produção sempre foi mediana, mas algo a deixa com medo de perder o emprego. Ela procura dar o máximo de suas forças, não salvo raro engano, ela faz várias horas extras por dia. Todos os dias. Joana trabalha tanto que não sabe se está no trabalho ou em casa descansando.


Como em toda triste realidade, Joana não tem tempo para seus filhos. Parece que as crianças foram tiradas de suas mãos tão rapidamente quanto foram postas no mundo. Não sabe quantos filhos ela tem, nem mesmo o que fazem da vida. Não seria exagero se disséssemos que ela não sabe nem se os filhos estão mortos ou estão vivos. Fim do dia.

Joana tem tanto medo que acha que podem lhe fazer mal no seu local de trabalho. Pensa que a qualquer momento, um ser horrível possa violentá-la e torná-la apenas mais uma estatística dessa sociedade hostil e violenta, lembrando o estado de natureza descrito por Hobbes, onde nada nem ninguém é respeitado. Somente o poder é conhecido por todos. Só que Joana não conhece Hobbes, muito ao menos o que seria estado de natureza. Ela só conhece o medo.

Sua alimentação parece torná-la cada vez mais obesa, para que possa produzir mais e pensar menos. Ela tem a sensação de que cada vez que coloca o alimento em sua boca, ela perde um pouco de si e esquece de tudo. É até um alívio aquele alimento, muito embora não se saiba de onde ele vem e nem qual a sua procedência. Joana come, e mais um dia passa.

Joana escuta o despertador, mas não sabe que horas são. O despertador parece sempre tão sensual aos seus ouvidos, ele entra como música nos seus ouvidos. Quase como se fosse um macho. Mas ela não tem tempo. Seu cubículo onde trabalha, com uma luz forte em seu rosto dá a impressão de ser eternamente dia em seu castigo eterno. Joana pouco tempo tem para conversar com suas colegas de trabalho.

A monotonia é pura e constante em seu trabalho. É meramente algo burocrático e sem sentido o que ela faz. Não compreende muito bem sua tarefa, nem qual a sua posição no mundo, mas continua realizando. Joana por vezes pensa que não é um ser vivo, é apenas uma máquina que repete e repete mecanicamente o que faz. Se tivesse visto Tempos Modernos, de Chaplin, ela se sentiria o próprio. Outro dia acaba.

Ao acordar, de novo parece estar no trabalho. Um ar diferente ronda o ar. Joana não sabe se é simplesmente um mau cheiro de alguma latrina próxima de seu local de trabalho ou se realmente é algo horrendo. Hoje ela consegue ter coragem e conversar um pouco mais com sua colega Alice, que fica do lado dela há tanto tempo que nem Joana se lembra do quanto.

Por ela, soube que vão ter dispensas na empresa. Soube que uma amiga sua, ontem mesmo, teve a sua cabeça cortada pelos seus empregadores. Parece que usaram o seu sangue para tempero. “Cada coisa maluca que se escuta hoje em dia”, pensa Joana, “daqui a pouco vão falar que existe um lugar livre, onde podemos amar e criar nossos filhos.”. Para ela, cabeças vão rolar é somente uma forma de expressão.

Porém, ocorre uma surpresa neste mesmo dia. O seu empregador chega. Olha para ela. Joana tem a sensação da demissão lhe rondando. Nunca havia visto aquele olhar em seu chefe. Beirava a crueldade, tamanha satisfação ao ver a pobre Joana confusa com tudo aquilo. Ele sorria. Ele sorria como se sorri para algo que se vai destrinchar e comer, depois de se matar.

Pensa em seus filhos e em tudo quanto poderia lhes ensinar se o seu emprego permitisse. Pensa que poderia ter tido um marido, um bom marido, se as coisas em sua vida fossem normais. Só que não são. Joana é levada para fora e degolada.

Joana era uma fêmea do Gallus gallus domesticus ou, em outras palavras, uma galinha.

sábado, 21 de novembro de 2009

Haroldices

Haroldo era um cara comum. Não conhecia muitas pessoas, nem queria. Seu mundo era perfeito, ou quase, do jeito que era. Haroldo gostava de cubos mágicos. Ele era completamente fascinado por eles. Tinha de todos os tipo, todas as marcas e todos os tamanhos. Em sua aflição, encomendou um enorme, em que cada lado tinha um metro. Óbvio que ele não consegue virá-lo. Resolveu, então, colocá-lo em seu jardim. Como se fosse um anão de jardim. Brincava ele que aquele era o seu pequeno anão de jardim.

Haroldo sempre foi fascinado por observações do cotidiano também. Gostava de contar quantos passos dava do seu quarto, até o banheiro, de volta para o quarto, até a cozinha e até a porta de casa, para ir na padaria comprar seu café-da-manhã. Ele gostava de cáculos e lógicas. Haroldo se tornou contador. Saía de casas poucas vezes: para ir a padaria todos os dias. Uma vez por semana ao psiquiatra. Uma vez no final de semana para comprar roupas na mesma loja. Uma vez por mês para comprar seu remédios psiquiátricos. Nunca se acostumou com terapia.

Foi a um existencialista, porém o achou vago demais. Humanista, mas ele se sentia mais à vontade com uma calculadora e uma tabela de Excel do que com um ser que respirasse. Foi para a freudiana, e todas as suas linhas: mas tinha um problema grave demais com a mãe e resolveu desistir. O terapeuta junguiano o lembrava uma historinha de contos de fadas e arquétipos. Resolveu fazer cognitivo-comportamental.... Também não deu certo.

Resolveu, então, aderir a teoria do cubinho. Comprou vários jarros. Sete, ao todo. E comprou vários cubos. As cores dos seus aborrecimentos variavam: verde para leves, amarelos para médios, vermelhos para graves. E comprou um preto. O preto era para o maior de todos. Um enorme. Para este, ele comprou o cubo preto de um metro cúbico, o suficiente para tapar o jarro. Etiquetou-os de segunda a domingo.

Fez um gráfico dos dias, semanas e do primeiro mês. Descobriu algo curioso: os verdes apareciam mais na segunda-feira, pois o pão sempre atrasava e o funcionário era lento. Na terça, apareceu um amarelo, por conta de uma grande empresa da qual era contador. Quarta tinha sempre um vermelho: o restaurante não fazia o seu prato de quarta-feira para entregar em casa. Quinta não tinha quase. Sexta, dois vermelhos: tinha problemas. Arrumava-se para sair de casa e depois se desarrumava por perder coragem. Sábado, eram dois amarelos: sua cor azul clara raramente tinha na sua loja preferida e o problema de achar vagas. Domingo, era o dia do preto. Almoçava com seus pais na casa deles.

Em um mês, resolveu reagir a tudo aquilo que o atormentava. Para resolver seus problemas de segunda, comprou vitaminas para o padeiro. Para terça, resolveu deixar a máquina de recados ligada. E contratou uma secretária só para as terças. Ela anotava os recados e passava para ele de modo suave. Sobre a quarta, mandou um memorando com as páginas e estatísticas para o dono, reclamando disso. O dono, então, mandou o cozinheiro fazer a sua muqueca de camarão com molho de manteiga só para ele. Afinal, ele sempre pedia comida nele. Na quinta, resolveu ser o dia internacional da leveza: comprava sempre meio litro de sorvete de ameixa.

Já na sexta... Tomava o dobro dos seus remédios às 22:00h. Assim, não se arrumava nem desarrumava. Sábado era um desafio, mas foi bem mais fácil. Ia e voltava de táxi. E achou um novo fornecedor de camisas para o dono da loja e pediu que mudassem de loja o funcionário que o atendiava, para que ao chegasse lá pudesse ser atendido por um senhor simpático que trabalhava lá (o dono da empresa só trocou o funcionário de horário... Mas ficou com o fornecedor novo, por ser mais barato).

E domingo? Como ele poderia resolver domingo? Se falasse que não ia, ele teria um problema com a mãe. Se inventasse qualquer desculpa, a mãe perceberia que ele estava mentindo. Não tinha tato nem tarimba social para enganar uma criança de três anos de idade. Ele esmorecia, torcia um pouco a boca para o lado esquerdo e suas duas sobrancelhas levantavam. Era ridículo. Parecia um palhaço depois de usar algum tipo de droga que deixava alguém chapado.

Foi aí que ele teve uma idéia genial. Ele contratou a secretária para fingir que era sua namorada. Para sua surpresa, a sua secretária aceitou. Ela tinha sido recomendada por um amigo que também tinha problemas. Ele havia falecido por um número excessivo de comprimidos tentado superar sua agorafobia. Depois deste detalhe, Haroldo resolveu trocar de lugar. O almoço seria em sua casa. Sua mãe reclamara com ele por telefone:

- Haroldinho, meu filhinho, sempre comemos aqui em casa.
- Mas mãe... É que eu queria apresentar uma...
A mãe o cortara asperamente.
- Não é uma dessas vagabundas da vida que querem desviar você do caminho de Nosso Senhor, certo? Ela NUNCA dormiu com você, não é?

A mãe de Haroldo, dona Eustáquia, era uma daquelas carolas de Igreja que se confessava dia sim e dia também. Haroldo tremia os lábios... Não sabia o que fazer. Foi aí que teve a maior surpresa de sua vida. Lúcia Helena, a secretária, perecebendo o seu exitar em falar com sua mãe, tomou o telefone de maneira célere de se umão e esbravejou:

- A senhora escute muito bem, eu não vou pemitir que a senhora se meta em meu relacionamento com seu filho. Eu sou atéia e pra mim Deus não vai me castigar por estar tendo relações sexuais com seu filho, este homem maravilhoso e másculo, esse deus grego espadaúdo e de lábios quentes e mãos...

Lúcia Helena não completou. A mãe dele havia desligado, apesar do tom sereno de sua voz e um gosto de cereja que saía de sua boca. Haroldo ficou transtornado. Pegou o cubo preto e colocou em cima de todos os outros coloridos dentro do dia de domingo. Ficara desesperado com o que acontecera. Atônito, ficou sentado na sala.

De repente, Lúcia Helena o surpreendeu e colocou a sua mão sobre a dele. Haroldo assustou-se. Fazia 15 anos, 11 meses e 10 dias que ninguém fazia isto com ele. Seu lábios trepidavam, suas mãos suavam e seu rosto estava tenso. Lúcia levantou a cabeça de Haroldo e lhe deu um beijo. Na boca. Estalinho. Ele levantou-se rapidamente. Aturdido, ele a afastou. Pegou todos os seus jarros e cubos. Corria com eles. Lúcia Helena se mostrava intrigada. Ele pediu para ela abrir a porta e ele abriu. Jogou todos eles no chão e pediu ajuda a Lúcia Helena. Rolaram o cubo enorme sobre tudo aquilo.

Nesta tarde, Haroldo perdeu a virgindade. Não seus comportamentos obssessivos-compulsivos, nem seu pouco (quase nenhum) tato social. Tornou-se um aprendiz de amante. Lúcia Helena ganhou um lar, um marido e largou sua carreira de prostituta. Dona Eustáquia passou a almoçar com seu filho em sua casa. Engolindo a péssima comida de Lúcia Helena, sua única nora. Em dias bons, Lúcia Helena comprava comida do restaurante preferido de Haroldo (ela só cozinhava aos domingos, em homenagem a dona Eustáquia. O pai de Haroldo, no entanto, encontrava-se com o filho sozinho para jogar bocha na praça perto da casa de Haroldo. Nunca mais ele fora a casa do filho.

Ah... E se se importou com o padeiro, ele morreu de infarto por causa das vitaminas. O dono da empresa que o atormenta às terças, casado e com três filhos separou-se de sua esposa para viver com um homem, pois Lúcia Helena não mais aceitava fazer serviços sexuais. E o senhor da loja, por causa do aumento das vendas por conta de Haroldo e de sua esposa, virou gerente. E o rapaz que atendia Haroldo, bom este continua na mesma... Em outra loja, como Haroldo sempre quis. E o pai de Haroldo... Bom, ele também teve que arrumar outra garota de programa.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

CAMPANHA: AR CONDICIONADO

Fazendo uma pequena pausa nos relatos, vamos todos mandar um e-mail para deus@ceu.com para que ele ligue o ar condicionado do mundo!!! 20 graus na cidade e 24 na praia! Vamos aderir!!!!!!!

Dos pequenos pedaços... Dos que contam...

Recebi a notícia de que um parente de um amigo meu faleceu. Ele estava arrasado. Suas notas decaíram desde o fato e ele se encontra confuso. A adolescência nunca é um período fácil para ninguém, nem para um garoto bom e ingênuo como ele. Conversando sobre a sua falta de rumo, ele dizia que pelo falecimento não conseguiria reagir.

Período difícil da vida, ponto dificílimo de qualquer um: a morte. Algo inevitável a qual todos nós estamos sujeitos. Contei para ele que se esta pessoa era tão especial na vida dele, gostaria que ele andasse para frente e não para trás. Só se fosse um pra trás e dois pra frente.

Não enganei ele como fazem as pessoas. Contei para ele que esta dor não vai passar. Não também que ela continue enorme, como um buraco no peito. Contei que estas coisas, com o passar do tempo, se tornam lembranças agradáveis dos bons momentos em que conviveram. E que esta pessoa fica marcada em nossa vida como o primeiro gosto do beijo ou o primeiro picolé.

Esta é a parte da vida em que devemos nos impulsionar, embora a dor seja imensa. Embora pareça que não haja esperança. Embora pareça que a morte cerca você por todos os lados. Embora pareça que o coração aperta de uma tal maneira que parece que não há solução... Parece que a vida lhe vira a cara. Depois, ainda se cai mais... Mas é somente nossa opção querer criar nossas próprias asas e voarmos até os limites de nossa imaginação... E além.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Pequeno Pedaço n 5

Roda o louco artista
Em sua busca de algo
Roda a louca vida
Em sua eterna luta

Volta e meia,
Pode se ter uma inteira
Ou da inteira
Virar um vazio

Pinga a gota na pia
Um barulho seco
Um barulho de sexo
Ouço em outro pavio

A paz da companhia
Nunca chega em nós mesmos
Nunca será nossa
Na diária da vida

Nem mesmo em um diário
Postagem ou blog
Podemos apaziguar o que sentimos
Ao menos, tentar

IN(terna)FRUTÍFERA

As poucas palavras rolam
Babam da boca como vento
Tocam o ar e somem
Desaparecem

Nada parece que anda
Nada parece que toca
Nada

Apenas há o silêncio
O Vazio de poucos muitos momentos
Pouco a ser feito ou dito
Ou nada

Parece-me estranho isto
Mas sigo fazendo
Nada ou pouco
Ou, pelo menos, algo

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Banana é diferente de coco

Eu vi um pai e um filho conversando em frente a uma bananeira. O filho, admirado, perguntou ao pai:

-Pai, esta é uma árvore linda.
-É sim, meu filho. É uma bananeira.
-Que linda, pai! Pega um coco para mim?
-Filho... Esta é uma bananeira, não um coqueiro. Um coqueiro dá coco. Um bananeira dá banana.

Olhando aquela bonita cena, me lembrei de como criamos expectativas em relação principalmente às pessoas. Pensamos algo sobre elas e simplesmente concluímos vários pré-supostos nem sempre verdadeiros. A partir do momento que não conseguimos o que esperávamos, tamanha nossa ansiedade, nos frustramos em relação ao outro. E, a partir disto, minimizamos aquela pessoa.

Não podemos esperar que uma bananeira dê coco. Nunca. As pessoas são só pessoas. Raramente, muito raramente, elas mudam. As pessoas mudam em relação a necessidade de que se consiga um objetivo. Mas mudarmos o que nós somos, mesmo que nós não gostemos, é um custo muito alto. Nem sempre estamos dispostos a pagar a emoção necessária para que seja feito.

É aquela velha história da relação custo/benefício. Embora haja a regra geral de que menor custo com maior benefício é melhor, nem sempre percebemos isto quando envoltos em contratempos ou enquanto não mudamos nosso visão de mundo. Decisão, é no sentido lato da palavra, cindir sobre os caminhos que podemos escolher. E que são nossos. Somente nossos.

sábado, 14 de novembro de 2009

Linha do Tempo

O tempo custura a alma
Como uma peça de roupa
Cada segundo que se passa
Um acabamento novo é dado
Sem se perder o feitio original

O tempo nada perdoa
Nem a criança, nem o idoso
Ele muda o riacho
E a água nele corrido

O tempo vai
O tempo vem
Como as ondas do oceano
Nos puxando pras suas profundezas
Com até pouca delicadeza

O tempo não é o remédio
É quanto o temédio leva a fazer efeito
O tempo não é triste, nem alegre
Nem tédio, nem extâse
Ele apenas o é

Tic Tac

O relógio de corda balança
Na sala vazia do casarão
Tudo o que tu me dizias
Caía pelo chão

Palavras ao vento
De nada valem
Quando não caem em solo fértil

Não gosto de tudo certo
A toda hora, todo momento
Que inferno, tal instrumento
De controlar um rumo no deserto

Não sei se rimo,
Não sei se não
Ao final desta última mão

Hileane

Pequenos momentos percebidos
Na infindade de sentimentos
Coisas ínfimas de nós dois
Atando os nós de cada casal

Idiossincrasias do cotidiano
Muito acrescetam
Em nossa relação

A dois, tudo se pode
O proibido vira o permitido
E, entre suor e prazer
O estado é alcançado

Amo-te
Em soneto, verso
Verso concreto e poesia
E até onde mais não caberia
Amo-te

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Pedacinhos IV

Pequenos nós somos
Em nós mesmos
Pequenos pedaços de nós do cosmos

Pequena poeira que move-se
De um lado para o outro
Como se fosse algo
Ou um pato num lago

Grandes nós somos
Em nós mesmos
Em grandes momentos de explosão

Grandes feitos que movem montanhas
Montanhas de sal, de ouro ou diamante
Ou seria melhor de sentimento?
Que faz parecer um monumento

Tudo que somos, somos
Por podermos fazer algo
Ou não fazer

Alguns arriscam
E devemos riscar os erros
E remendar de modo bom
Sem perdermos o tom

Uva passa

Por diversas vezes na vida, buscamos significados para nossas derrotas. Valorizamos por demais os erros. Não devemos apunhalarmos com nossas próprias falhas. São nossas. E erros... Bom, dizem que de boas intenções o inferno está cheio. Pode até ser, até concordo em parte com isto.

Tirando que para mim o inferno é no sentido original, interno, sendo nós o nosso próprio inferno e céu de cada (Cazuza), podemos pegar um pouco mais leve com a gente. Por que não? Na vida, as vitórias e as derrotas passam. E, no final das contas, sempre termos histórias para contar.

Tinha uma piada ridícula de que tudo na vida passa, até a uva passa. Boa filosofia. Gosto dela, mesmo sendo aparentemente ridícula. São nessas pequenas coisas que encontramos alguma parte de verdade.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Redenção

Passamos a vida inteira nos torturando por pequenos momentos. Por grandes motivos. Por motivos que devastariam a humanidade. Salvaguardando pequenas medidas, todo sofrimento é maior quando é nosso. Em nossa imensidão do nosso universo interno, temos a teimosia em acreditar que somos mais importantes do que o que somos. Calma... Eu explico.

Na vida, perdemos mais do que ganhamos. Não, não sou pessimista. Sou otimista. Quando escolhemos uma opção dentre as demais que existem, para aquele momento, estamos deixando de viver as várias possibilidades por uma única. Difícil? Muito. Doloroso? Também. Aliás, o termo decisão vem de se cindir, se separar de algo por um outro algo.

É neste termo que na maioria das vezes nos punimos por não termos seguido o melhor caminho. Não disseram ainda, mas não existe o melhor caminho. Existe um caminho que não conhecemos, que achamos que pode ser melhor do que o outro, que queremos que seja, que desejamos tão profundamente que seja que quando não se realiza... Quebra. E quebramos, em parte com ele.

Não devemos nos envergonhar disto. A dor por perder é grande. Mas tem de ser lembrada a satisfação por ter arriscado. Brinco que se todos tivessem nascido perfeitos como eu (com exceção da modéstia, o que não me faz ser totalmente perfeito) teríamos um mundo mais feliz? Não sei... Não sei mesmo. As pequenas idiossincrasias é o que nos torna o que somos.

Quantas vezes ao acharmos que falhamos, nos lamentamos demais. Após um tempo, descobrimos que aquele seria o melhor caminho. Ou não. Mas devemos valorizar mais, muito mais os nossos ganhos. São o que nos dão mais satisfação, mesmo que seja o da dor. Quem sabe, com alguma sorte, conseguimos algo de amor?
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