segunda-feira, 26 de julho de 2010

Jocimar e Antonieta

Jocemir era um tímido poeta. Gostava de ser poeta porque via beleza nas pequenas coisas do mundo, embora sofresse com isto. Vivia uma montanha-russa emocional, mas tinha se acostumado a ela durante todos estes anos. Após algumas desilusões amorosas, foi-se enamorar por Antonieta, uma mulher linda e exuberante. Achava que nunca conseguiria alcançar as expectativas dela, por isto preferiu deixar toda a relação que tinha com ela relegada ao amor platônico.

Encontravam-se, sempre às tardes e conversavam em um café próximo ao trabalho dela. Ela o tinha procurado uma vez, por intermédio de uma amiga, para que pudesse ajudá-la a atravessar uma relação difícil pela qual estava passando. Ele, sempre solícito, foi ao encontro dela. Nos dias de semana, sempre estavam lá para conversar um com o outro. Por vezes, quando não havia assunto, inventavam algum. A sincronicidade era aparente e, aos poucos, foi-se tornando intensa.

Até que, depois de algumas semanas, meses transformaram a relação deles em algo puro e bonito. Não que Jocemir fosse dar um passo à frente, longe disto: mantinha-se distante. Contentava-se com o toque dela, nas vezes em que eventualmente esbarravam um no outro, na mesa. Antonieta, por sua vez, achava interessante aquela figura. Fascinava-a ver como tratava o ser humano com uma candura e cuidado ímpares. Até que, um dia de segunda-feira, ela veio com uma novidade.

Ela iria fazer um treinamento para poder assumir uma função de chefia. Ele alegrou-se e muito com a idéia. Mas, quando ela relatou que ficaria alguns meses fora, ele simplesmente não conseguiu esconder a tristeza. Quando ela perguntou o que tinha acontecido, ele afirmou que nada havia ocorrido, ele somente estava feliz ao ver que ela iria voar mais alto dentro da empresa. Falou que todo bônus exigiria um ônus e que ela deveria entender isto como uma forma de cada vez ir mais longe.

Ao final da conversa, ele esperou-a sair para chorar. Baixinho, como costumava fazer. Desejou nunca a ter conhecido por ser covarde demais para tomar a atitude que deveria tomar. Resignou-se; de nada adiantaria agora. Ela estava indo embora e, provavelmente, iria conhecer um homem não melhor do que ele, mas pelo menos que fosse mais firme em suas decisões. Melancólico, foi para casa. Tomou uma longa ducha quente. Sentou-se, no chão, sentindo o frio dos azulejos constratando com a água.

Ao término de quase uma hora, saiu de lá. Resolveu, então, tomar coragem para fazer algo. Riu de si mesmo e lembrou-se de um texto que escrevera há algum tempo: em resumo, falava do amor de um homem por uma mulher que só se concretizou quando ele teve a certeza de que poderia perdê-la. Balançou a cabeça, tentando apagar aquela ironia latente e concentrar-se na sua atividade. Iria tentar demonstrar o seu afeto por ela, mesmo que fosse tarde demais. Do seu jeito, arriscaria.

No dia seguinte, Antonieta o esperava no café. Chovia um pouco, e ela pediu um café antes dele chegar. Ao entregar o café, a garçonete entregou-lhe um bonito envelope. Ela estranhou. Abriu-o. Estava escrito assim:

"Carta a um amor não-dito

Cara Antonieta,

Sei que nunca disse o quanto você é importante para mim. Uso tão bem as palavras nos meus textos, mas lá elas sempre estarão seguras, nunca machucarão de onde elas são concatenadas. Mas com as pessoas é sempre muito difícil para mim. Não porque não as amo; creio que é porque as amo demais. Na maioria da vez, um amor fraterno. Destarte, devo avisar-te: não é somente este amor que cultivo por ti no âmago do meu ser.

Dos meus lugares mais recônditos, vibro cada vez que a vejo. Não desejo perder-te nunca em minha vida, acredito que seja esta a razão pela qual nunca expressei tudo o que sinto por ti. Agora, diante desta anunciada separação, sinto-me vazio. Parece-me que puxaram o tapete de meus pés. Perdoe-me o meu sentimentalismo, mas tento ser o mais objetivo possível com sentimentos - tento ser, mas não consigo. Vê minha dificuldade?

Vou dar lugar ao azo e fazer disto o que tenho a intenção: eu te amo. Amo-te tanto e de maneira tão grande que sua simples ausência me faz perder os sentidos. Tudo aparenta agora ser cinza e sem graça, nem mais o que me fazia rir me faz... A única exceção é quando lembro de ti. Nossas horas juntos - permita-me usar nossas - sempre tão repletas de infindos sentimentos que nem ao mesmo sei classificar. Tudo o que tenho escrito e pensado nestes últimos meses é único e exclusivamente teu; tens sido minha musa inspiradora, mesmo sem saberes.

Nada disto importa agora: estás partindo. Saibas que sempre terá o meu porto seguro na tua volta, poderás recostar no meu ombro e contarás comigo nas horas mais obscuras dos dias mais tristes. Quero, contudo, ressalvar a possibilidade que contes comigo também para os dias felizes - mas são nos tristes que contamos em quem mais confiamos, não? Serei tudo isto para você hoje e sempre, desde que possa entender que ver-te hoje seria matar-me um pouco. Perdoe-me a covardia.

Do seu,

Amor."

À medida em que lia a carta, Antonieta emocionava-se a cada linha. De parágrafo em parágrafo, sentia-se querida como nunca por alguém por quem sempre teve estima, mas também não quis dar um passoa adiante. Identificou-se com a covardia e alegrou-se com a proposta. Aquele homem maravilhoso e único, que sempre a tratara como nunca fora antes em toda a sua vida, estava abrindo o seu coração para ela. Ela só poderia tomar uma atitude.

Enquanto Jocimar tentava distrair-se com a televisão em casa, sentiu fome. Pediu uma pizza. Esperava-a chegar enquanto reclamava com o operador da tevê à cabo pela ineficiência do serviço prestado. Bateu o telefone na cara dele. Tanto a fome quanto a sua angústia tinham-no feito maltratar um ser humano. Não gostava disto e nem estava acostumado. Pegou o telefone para discar de novo, mas escutou a campainha. Alegrou-se: pelo menos aquela penúria iria passar.

Ao abrir a porta, viu Antonieta. Linda. Parecia um raio de sol, em um dia nublado como aquele. Em um gesto tímido, convidou-a para entrar. Ao fechar a porta, virou-se e observou que ela estava na sua frente. Reparou que seus lábios tremiam um pouco: estava molhada por causa da chuva. Imaginou que ela tinha andado cerca de dez quadras para chegar à sua residência. Disse para ela que pegaria uma toalha, mas ela segurou a sua mão.

Olhou-a fundo nos seus olhos negros e dali em diante, amaram-se. Todas as dores e desesperanças, todo amor retraído por aqueles dois fluiu numa intensidade tamanha que amaram-se por horas a finco. A mera menção de parar por uma das partes apenas fazia a outra incentivar e encher de mais desejo algo que já não tinha uma medida. Ao final, exaustos, riram-se timidamente: ambos, do seu jeito, deram um passo a frente rumo à felicidade de ambos. A ironia era a que os obstáculos eram transponíveis, embora doridos. Mas, após isto, tudo valeria à pena.

sábado, 17 de julho de 2010

Rachel

Rachel estava tentando enterrar um grande amor. Começou a se afastar dele, pedindo um término. Daí poderíamos inferir que tudo estaria acabado e que ela própria teria virado a página daquela história. Estranhamente, para uma mulher tão decidida, fatos atípicos estavam começando a ocorrer em sua vida.

Crises de choro pela ausência do objeto amado. Falta de apetite. Perda gradativa dos estímulos sensórias de seus neuroceptores, com exceção dos nociceptores – este aumentava seus impulsos de uma maneira exacerbada. Visitava constantemente a página de contos dele e nem ao menos vou descrever a quantidade de vezes que acessava a página de relacionamentos dele.

Acrescentaríamos mais um sintoma: tinha percorrido em direção às terras estrangeiras, ansiando por vê-lo – não que tivesse marcado um encontro, mas buscava tê-lo por perto nos mínimos referenciais possíveis. Iria ela descobrir o caro de preço de se tentar conter a força do inconsciente. Desejava ser menos mecânica e mais botânica. Lembrou-se do Mágico de Oz e daria de bom grado o seu coração para o Homem de Lata; ela desejava arrancá-lo do peito, pois o mesmo a dilacerava por dentro.

Ela, ainda negando, buscava o afeto dele, como queria isto: mesmo que fosse através da dor. Ele lhe havia proporcionado tanto prazer, com as palavras certas nas horas exatas, os sussurros caprichosos ao pé de seu ouvido... E o tamanho do amor pulsante que ele nela introduzia pelas mais diferentes vias. Ela sentia falta de todas essas miríades de possibilidades, ainda mais por todas as prometidas e não realizadas.

Tinha a sensação de que tentava tampar o vazamento de uma represa com uma rolha; havia se emaranhado em sua própria teia. Se tentasse sair dali, teria que deixar uma pata ou duas. O que no início tinha vindo como uma brincadeira de criança, evoluiu a um jogo de adultos até se locupletar na devassidão dos amantes. Pensou numa ridícula situação: ela, que tinha acabado por terminar com ele, por medo de ser feliz, poderia não mais tê-lo por medo que ele tivesse de se machucar caso mudasse de idéia.

Transtornou-se com este mero fato. Ela tinha tocado o seu coração, e, mais ainda, deixou que ele tocasse o seu, derretendo as mulheres gélidas por ela erigidas. Sentia-se acuada e pequena. Lembrou-se da música do Renato Russo: “ Te ver é uma necessidade / Vamos fazer um filho.” Após isto, verteram lágrimas mais intensamente do que antes, coisa que ela já achava impossível: cria que já não tivesse mais lágrimas de tanto que já tinha se debulhado nelas.

Fazia dias que dele não tinha notícias, dias que pareciam imensas eternidades. Rachel nunca saberia as coisas que poderiam ter acontecido. Iria odiar-se descobrisse o fato de que ele quase fora no mesmo lugar que ela, em suas terras, mas não teve coragem de sair da cama pela dor que a separação lhe impingia. E o mais interessante... O que ela faria se o visse? Já o procurava em todos os lugares de lá, desejosa disto; queria encontrá-lo "por acaso", para que não parecesse que havia ido lá só para isto.

E também nunca saberia que o seu amado, ao sair do trabalho às quatro da tarde, procurou o corcel negro de sua donzela e assustou-se ao encontrá-lo: porém, não o dela. Ele não entendia o porquê daquele sofrimento, o porquê da separação. Resignou-se ao pensar que ela achava que nunca o faria feliz ou que faria a ele coisas horríveis. Só assim para poder ele prosseguir em sua seara. Poucas lágrimas rolaram pelo seu rosto... Ele, agora, já estava ficando sem elas.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Josimar e o gris

Chovia naquela sexta-feira tristonha. Enquanto Josimar andava pela rua, em direção ao seu prédio, um gosto de amargo subiu-lhe a boca. Não teria mais a sua linda mulher para lhe tirá-lo com palavras gentis, carinhos ou calorosos beijos. Seu relacionamento tinha chegado ao beco sem saída onde, inevitavelmente, um dos dois pede para sair dele. E, no caso do relacionamento dele com Bertália, tinha sido Bertália.


Antes de entrar na viela que conduzia a seu prédio, apreciou aquele momento. Era um momento de solidão, algo meio gris; o vento zunia-lhe pelas orelhas, sussurrava palavras de pranto. A chuva que precipitava, misturava-se com suas lágrimas em algo poético e doloroso. Como pôde perder alguém que lhe era tão caro, ainda sem entender? Como as pessoas saem de nossas vidas, pedindo desculpas, mas saindo das nossas vidas? Como alguém que não quer sair, opta por?

Tudo isto não ajudava em nada. Parou. Aumentou a intensidade da chuva e ele se deixou matizar por ela. Notou que desde que ela foi embora, não parava de chover. Até o céu estava triste com a separação daquele belo casal. Deu de ombros: não havia mais nada que pudesse fazer. Fora até o seu limite, suportando todas as intempéries e buscando sempre pensar no lado de Bertália. Sobrou-lhe, então, o último argumento do herói romântico.

Ela pediu a separação. Ele aceitou. Sabia que o amor era como um pássaro, devia ser deixado livre para ver se voltava para o seu caloroso ninho. Após ficar um pouco encharcado, adentrou na portaria e tocou o botão do elevador. Pensou que tinha deixado o celular em casa para não esperar por uma ligação dela. Riu-se do quão nécio estava sendo: pensava o tempo todo nela e em como ela poderia a qualquer momento ligar.

Abdicou de criticar-se mais – já estava sofrendo mais do que o suficiente. Não conseguia trabalhar, nem sair, nem pensar em mais nada a não ser a falta que ela fazia. Questionava-se se ela sentia o mesmo. Nunca saberia, contudo. Ela não ligaria nunca mais. Nunca mais os beijos, nunca mais o romance, nunca mais a voz dela rouca e sua risada em espiral, linda, que sempre o fazia admirá-la.

Ao entrar em sua casa, escutou “Pedaço de mim”, do Chico Buarque. Parecia realmente o reverso da dor de um parto. Tentou escolher um vinho na geladeira, mas era a marca preferida dela. Desisitiu. Balançou a cabeça e desligou o som. Gostava tanto daquela mulher, com tamanha intensidade, que mesmo que sofresse era como se ela estivesse perto dele, mesmo que fosse em memória, mesmo que fosse no momento mais agudo de seu pranto. Estava tentando se acostumar com a idéia do nunca mais.

Tomou uma ducha quente. Ficou bons minutos ali, tentando fazer com que a água levasse a angústia embora. Tentou distrair-se com qualquer coisa, para que Morfeu o arrasta-se daquela terra e pudesse, ao menos, sonhar com ela algo feliz e bonito. Algo que pudesse honrar tudo aquilo que ele haviam vividos juntos: um amor bom, puro e belo. Mas que tinha acabado o seu prosseguimento, deixando um devastado campo de dor.

Ariadne

Ariadne estava confusa. Sentia-se como uma criança que vai a loja, escolhe o brinquedo meses antes de seu aniversário e, quando retorna até lá, na ansiedade de que ele esteja... Descobre que ele está lá. Daí, não é este só o problema: é o medo de levar aquele brinquedo tão sonhado para casa e ele não corresponder a tudo aquilo que ela imaginou. Só que ela não estava escolhendo um brinquedo.


Ela estava escolhendo um relacionamento. Na verdade, estava escolhendo ter ou não um relacionamento com um homem que parecia ser tudo o que ela sempre pediu, como a menina que vai a loja. Ele, porém, quando chegou, assustou-a. Primeiro, ela pensou que não era merecedora daquele amor. Depois, achou que não poderia fazê-lo feliz. A seguir, resolveu terminar com ele pelo fato de que preferia evitar sofrer no futuro.

Ariadne pensou assim: melhor agora, do que mais tarde. Resignou-se, com o fato de que não preferia arriscar. Lembrou-se da música “O medo de amar é o medo de ser livre” e lembrou que nunca a tinha escutado. Naquele momento, o que ela mais desejava é ter sido mais “Fé cega, Faca amolada” para que pudesse ter escolhido por ele. Entregou-se a sua característica de não arriscar.

Em um segundo momento, pensou: “Como assim eu não arrisco?”. Lembrou por tudo o que tinha passado, relacionamentos, escolhas profissionais difíceis e, acima de tudo, escolhas familiares. Ela, em tudo, tinha conseguido mais do que medianamente ultrapassar vários obstáculos. Como uma mulher como ela poderia ser tão vacilante no amor? Sofria muito com isto. Queria ser feliz, mas tinha medo de dar o primeiro passo em rumo a liberdade.

Lembrou-se da tatuagem de borboleta azul na nuca, a qual nunca realizou. A seguir, das aulas de surfe que nunca tomou. Percebia, então, um vácuo na sua vida em aproximadamente quatro anos. Não é que ela fosse acostumada a ser infeliz, tinha se submetido a uma dose diária de infelicidade na qual o seu amor tinha lhe aberto os olhos. Isto dói... Lembrou-se do conto da caverna, de Platão. Lembrou-se de como era difícil sair da caverna; sabia que, ao sair daquela onde se encontrava, poderia ser feliz.

Parou. Iria racionalmente pensar na situação. Era algo novo, tudo bem; conquanto, o que ela estava vivendo era bem pior. Pensou que poderia levar adiante e projetou no futuro, daqui a uns cinco anos. Lembraria ainda dele como a pessoa mais especial de sua vida, tendo se tornado uma pessoa um pouco mais amarga por não ter optado por ele. Poderia relevar isto? Avançou mais cinco anos... Com quem ela envelheceria? Como ela envelheceria sem ser amada daquele jeito?

A projeção parou só em dez anos. Ela tinha trinta. Qual seria a escolha do seu coração? Ah... Isto ela já sabia de cor e salteado, perdoando o pleonasmo. Por que, então, era claudicante ao dar o próximo passo, em direção a sua liberdade? Só se... Se estivesse acostumada a ficar infeliz. Era isto... Foi a sua resposta. Sorriu, até para ela: poderia ter decidido agora. Mas não decidiu.

Se era a melhor escolha, por que estava doendo nele e nela? Nele... Como será que ele estava? O que ele estaria fazendo? Será que ainda a amava? Será que poderia perdoá-la por... Perdoá-la? – “Por fazê-lo sofrer.” – disse ela, a sua própria consciência. Ela lembrou de uma frase dele, muito bonita e tocante: “Perdoaremos tudo um do outro, desde que estejamos juntos. Afinal, só perdoamos aqueles que nos arriscamos para termos.”

Agora... Depois de lágrimas, lenços cheios de material nasal jogados fora, dias passados usando o mesmo pijama, a tormenta que lhe afligia iria passar? Não iria. Ela ainda não tinha se decidido: nem pela felicidade nem pela sua continuação daquele estado. “Ele poderia liga”, pensou ela, esperançosa. Olhou para o celular. Não havia nenhuma ligação. Percebeu que olhava várias vezes o celular, a página de relacionamentos, o correio eletrônico... Qualquer sinal de vida que ele pudesse dar.

Desabou, mais uma vez, na poltrona da sala. Tudo lembrava ele: os seriados, os comerciais, as músicas, os gostos... Percebeu que, agora, a comida não tinha sabor, o perfume não tinha cheiro, as cores do dia pareciam mais cinzas, tudo... Tudo estava desbotando. E ela também estava desbotando. Ela falou para o seu pintor, com sua aquarela, parar de pintá-la com seus lindos sentimentos. O que ela faria agora?

Ou, para verem e ouvirem: http://www.youtube.com/watch?v=KeAKxiPUBLE

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Joseanne

Joseanne estava sofrendo. Mesmo sendo uma mulher competente profissionalmente, nos altos dos seus trinta e três anos, ela sofria de amor. Havia tido a oportunidade de provar um amor tão puro e belo, mas resolveu não apostar suas fichas nele. Nos aproximadamente seis meses que vivenciou esta experiência, sentiu-se a mais valorizada das mulheres. Não havia palavras para poder descrever o que sentia: o seu antigo parceiro conseguia realmente a deixá-la nas nuvens.


Ela, porém, sentia-se insegura em relação justamente a medida deste amor: se ela amava-o tanto, qualquer coisa, por menor que ele fizesse, poderia abalar a concepção dela na experiência deste amor. Um dia, como todo casal, discutiram por uma infinidade de pormenores. Pequenas coisas, do dia-a-dia. Após a discussão, tudo estava se aprumando. Foi quando ela se perguntou se deveria seguir adiante.

Não é que não mais se visse como mulher daquele jovem, não mais que ele não o fizesse feliz ou, tão pouco, que o amor deles não fosse verdadeiro: ela simplesmente cogitou a possibilidade de um dia ele ir embora. O que ela faria quando o outro vai embora, deixando claro que não poderia dar mais certo. Ele sempre dissera isto:

- "Tem que estar bom para os dois, senão tem que conversar. As coisas sempre se acertam enquanto ainda nos amarmos." - dizia ele, carinhosamente e sorrindo.

Isto tudo parecia-lhe estranho. Um amor tão grande... Como faria se fosse perdê-lo? Em nenhum abrigo poderia recorrer, o seu tão querido e caro amor tinha ido embora. Tinha ido? Nada disto ainda sequer tinha acontecido, mas isto... A possibilidade de perdê-lo depois de algum tempo já a vinha assombrando. Resolveu, então, como toda boa médica, tolir o mau pela raiz: dispensou o seu tão caro amor.

E ele foi embora, choroso, triste e nauseabundo. Ela tinha tomado a decisão certa. Chorou, bastante. Como poderia ter tomado a decisão certa se ela sofria? Procurou algo para ler, adentrando em sua biblioteca. Um de seus hábitos era ter vários livros em casa, além dos de medicina. Achou um texto sobre dor e amor. Obviamente, um autor de qualidade, ela sorriu, antes de, novamente, chafurdar-se em lágrimas.

Leu o quanto era importante o sofrimento ser apenas opcional. E era. Mas o sofrimento só poderia ser opcional, dizia o texto, quando se arriscava. Ela chocou-se, nunca gostou de se arriscar, sempre preferiu a vida reduzida a um status quo, algo controlável. Um trauma de infância da perda de uma tia a fez virar médica e ter sempre medo de perder alguém adorável em sua vida. Por isto, ela preferia terminar do que a pessoa ir embora.

Sentou em sua poltrona, admirada. Colocou as pernas pra cima, ajeitando-se. Apoiou a sua cabeça no braço e lágrimas rolaram. Ela não tinha feito tudo o que poderia para poder assegurar o seu presente feliz. Não sabia o que fazer. Lembrou-se do filhote de elefante que fica preso por uma corda a um pedaço de madeira. Depois de algum tempo, ele já é adulto e, mesmo assim, continua ali preso por achar que aquilo o detém.

Balançou a cabeça, estava cheia. Queria esvaziá-la de algum modo. Dirigiu-se ao seu som e colocou uma música que a fazia lembrar dele: era natural, todas as músicas lembravam dele. Ele permeava cada essência do seu ser, mesmo estando distante. Foi, então, até a geladeira - o vinho com certeza a faria pensar de lembrar dele. Ledo engano. Sua tentativa infrutífera foi atirada nela mesma, pois lá estava a garrafa do vinho preferido do dois.

Sentia-se como uma mocinha, perseguida por fantasmas, em um filme de terror - fantasmas, contudo,  provocados pelo vazio de seu coração. Vacilava com sua decisão, questionava-se se era o melhor caminho a ter tomado em sua vida. Já não sabia mais se valeria a pena manter o status quo: eis que a razão afirmou prontamente que sim enquanto o coração veementemente... Ah, eles ainda iriam travar longos conflitos até uma solução. Se ela conseguiria arrancar aquele amor de seu peito ou se o amor iria fazer a razão mudar de idéia... Esta é uma curiosidade com a qual todos ficaremos.

Olá Blogueiros!!!!

Estou postando também os vídeos dos contos no Youtube. Sempre que possível, vou colocá-los aqui. Já há no Youtube:

A uma sem nome: http://www.youtube.com/watch?v=bfkXpg1kYAw
Theobaldo e o dia chuvoso: http://www.youtube.com/watch?v=tpdjo7WLIAU
Genésio: http://www.youtube.com/watch?v=cgLwjZi0YTw

Acessem!!! :)

Genésio

Genésio era um homem feito na vida. Tinha quase seus trinta anos e conservava um extremo bom humor e competência profissional. Sempre estava insatisfeito com o seu progresso dentro das empresas, desejoso a todo tempo de voar cada vez mais alto. Sentia um vazio, conquanto, ao chegar em sua casa e apenas ter o papagaio Pepe (tinha lhe sido dado por um amigo argentino) e uma secretária eletrônica sempre vazia. Todos que falavam com ele ligavam para os seus celulares - tinha três, ao todo.

Ele enamorou-se por uma médica um pouco mais velha do que ele. A princípio, a relação poderia ser resumida a "Fogo e Paixão", do Wando, no sentido de como era ardente o amor entre eles. Já o vocabulário proferido pelo casal, poderia se encontrar entre um dos mais peculiares do Dicionário: trocavam palavras difíceis como quem troca olhares de amor. E assim, foi-se indo a relação deles, até um dos dois inevitáveis fins: ou a morte de um, ou a morte da relação.

Ele não entendia a falta de vontade dela de mudar. Como poderia fazer de algo tão belo, um de cujus tão insipiente? Resignado, permitiu-se ficar triste. Era avesso a sentimentos, contudo naquele momento o que mais desejava era entender o seu presente. Não sabia exatamente como poderia fazer isto, mas sabia que poderia realizar de alguma forma. Lembrou-se, então, de uma antiga namorada de infância. Ligou para ela com o pretexto de pegar algumas fotos antigas.

Após um reluto dele em adentrar o domícilio dela, ele ficou alegre com a capacidade como foi bem recebido: não esperava isto, pois fora ele quem tinha extinguido a relação. Ela, então, perguntou a ele o que havia acontecido. Chorou feito criança, sendo acolhido por aquela mão amiga. Conversaram bastante, sobre tudo o que havia para ser dito sobre o problema dele e também sobre a relação dos dois. Houve uma pausa breve, um sorriso tênue por ambas as partes.

Sabiam que tinham encerrado a carreira deles como homem e mulher, entretanto estavam ali para um ajudar o outro. Sentiram-se felizes. Ele a levou ao emprego e desejou boa sorte no próximo relacionamento que ela estava esperando: uma apresentação despretenciosa para um amigo, de uma amiga. Ele sorriu e lembrou que parecia algo de adolescente, quando se ficam paquerando de um lado da festa até que um dos dois tem coragem para poderem conversar. Ela também sorriu e despediu-se.

Genésio tinha ido ao passado e agora entendia pelo que sofria. Ouviu várias histórias e seu dia estava, de triste, se transformando em atípico. Não sabia quantas nuances poderia esperar para algo tão diferente. Sabia, aliás, que o inevitável futuro estava chegando. Ele viria zunindo, como um mosquito que te acorda à noite, demonstrando a sua existência. Seria, porém, mais alegre do que o presente, isto com certeza. A beleza de se esperar pelo futuro é sempre o de que algo novo pode acontecer. E, se me permitem uma licença poética enquanto narrador, bem mais cedo do que se imagina.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Theobaldo e o dia chuvoso

Theobaldo era um bom rapaz. Prestativo, estudioso e trabalhador. Acrescenteríamos boa praça, sempre com um largo sorriso e uma mão amiga. Ele buscava sempre ser maior do que ele mesmo. Estava, porém, atrevessando um momento para lá de difícil: tinha almejado algo oneroso demais para si em um relacionamento. Acreditava que poderia ganhar. Infelizmente, não foi isto o que aconteceu. Sentia-se só e com pouca esperança.

Sentou no chão do seu quarto, chorando baixinho. Desejava com toda a força que a dor passasse, que o sentimento que o estava consumindo por dentro saísse do seu peito. A dor parecia um cão faminto, que rosnava para quem se aproximasse e impedia de ser tirado dali. Entre lágrimas e soluços, conseguiu se arrastar até o chuveiro. Ligou a água quente e sentou-se no chão do box. Ficou ali por vários minutos, incontáveis minutos de sofrimento.

Chorou tudo o que podia. Enxugou-se e, ao ir em direção a pia do banheiro, olhou-se no espelho: via toda a sua dor e desesperança estampadas. Não sabia o que fazer. Voltando ao seu quarto, decidiu folhear alguma coisa. Abriu um livro e leu algo lindo: "Não importa o que aconteceu. Importa o que você vai fazer com o que você deixou que acontecesse". Lembrou-se das aulas de filosofia, de Hegel, de tudo o que ele falava sobre a sua forma de pensar.

Sorriu. Não lembrava quando tinha sorrido nas últimas horas, mas este sorriso teve um gosto de certeza, de um caminho que deveria ser trilhado: a opção já havia sido dada pela sua ex-companheira, a opção de que ele não mais faria parte da vida dela. Sentou-se na cama e pensou na mulher fascinante que tinha perdido. Quase ia começar a chorar de novo, quando lembrou-se de algo: ela também estava perdendo aquele homem fascinante, romântico...

Lembrou-se de todas as vezes que conversaram sobre filhos, sobre futuro, sobre casamento; lembrava do quanto ela sorria de quando falavam de sua filha, a qual ele graciosamente tinha aceitado o bonito nome que ela havia oferecido a ele. Lembrou de todos os bons momentos de intimidade sexual que tiveram. Lembrou do quanto ela tinha dito que homem nenhum a havia fascinado daquele jeito e nem a satisfeito daquele jeito. Lembrou-se também das brigas, as pequenas asperesas ditas por eles ao tentarem satisfazer a tensão do amor que sentiam um pelo outro.

Suspirou fundo e sorriu. Algo dizia para ele que era definitivo a atitude que ela tinha tomado. Já ensaiaram essa valsa umas duas vezes, mas agora ele tinha a certeza. Ela estava esquisita a semana toda, raramente o chamando de amor: o que ela adorava fazer, puxando o "r" do final da palavra. Lembrou-se do gosto do seu beijo, do seu cheiro, do seu toque... De tudo o que um fazia com o corpo do outro. Lembrou-se dos diálogos inteligentes e de tudo o que tinha acontecido com eles no tempo em que estavam juntos.

Ele lembrou-se de como orientou a auto-estima dela profissional e pessoal. Ela afirmava sempre que era a mulher mais feliz do mundo ao seu lado. Ele sentia-se feliz com isto e, de certa maneira, não acreditava que conseguia realizar isto. Ela o fez um homem mais seguro, mais alerta... E ela o havia amado. Disso ele tinha certeza, assim como ele a tinha amado. Mas a história tinha acabado, pelo menos entre eles dois.

Olhou pela sua janela e viu o tempo chuvoso, triste... Como se todas as lágrimas dos deuses chorassem pelo fim de um amor tão puro, genuíno e verdadeiro. O mar batia suas ondas, como se até Netuno não acreditasse nisto. Pan, o rei dos faunos, chorou por ver seus dois filhos se separem e decretou que não mais haveria festa naquele dia. Tudo isto, tudo isto pelo que havia cindido neste dia.

Ele, por sua vez, sentiu-se abraçado pelo mundo, como se algo maior, como se a própria vida estivesse lhe oferecendo a mão e um ombro amigo para que ele pudesse transpor os momentos de dor pelos quais ele passaria. Sabia que passaria. Sabia, contudo, que também teria os seus momentos de felicidade. Seriam menores, no início, mas sabia que eles iriam chegar. Ele esperaria pacientemente por eles, como quem espera a primavera dos frutos. E ele, então, iria saboreá-los.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Jonathan e Wanessa

Jonathan era um sujeito assaz intrigante: possuía uma alma de adolescente, mesmo sendo já um adulto. Buscava, quando enamorava-se por alguém, transformar aquela pessoa em seu mundo - tudo o que ele fazia, realizava pensando nela; o ar que respirava perto dela tinha mais doçura, o simples fato de tocar a pele daquela que era sua amada fazia eclodir nele sensações avassaladoras. Sabia, contudo, retribuir na mesma medida o prazer que ela lhe dava. E assim vivia seus dias, sempre com um amor para chamar de seu.

Conheceu Wanessa em um destes sítios da internet. Conversaram durante algum bom tempo e, após isto, trocaram o sítio de bate-bapo por um local mais privado, um programa de mensagens instantâneas, com direito a câmera. Ao conversarem, ela descobriu que ele era realmente um bobo: chamava a fruta kiwi de "quivi" - porque era assim que deveria ser chamada, era uma fruta tropical. Trocavam palavras difíceis, com um rebuscado ornamento.

Através dos vocábulos digitados e ditos, estreitaram um laço de ternura um pelo outro. Através do primeiro encontro, do primeiro toque, do primeiro beijo... Ah, poderíamos dizer que estavam ali arraigando uma futura árvore, cujo o produto por ela gerado só poderia ser o mais doce e puro amor. Jonathan sempre lembrava de seu amor assim: um olhar profundo e um quê de distante das coisas mundanas, uma leve maquiagem - nunca exacerbada -  para definir uma feminilidade e um perfume capaz de pregar peças no próprio Cupido.

Porém, nem tudo na nossa vida é um perfeito conto de fadas. O nosso pequeno protagonista tinha uma característica peculiar: ao estar com ela, era uma rocha de certeza sobre o que sentiam. Com a distância, a sua carência e seu medo de perdê-la o faziam vacilar, por vezes, como um barco a deriva da sua própria tempestade emocional. Em uma destas conversas que era melhor não ter acontecido, ele cobrou dela. Cobrou dela atenção, afeto, amor... Tudo aquilo que ele achava que deveria cobrar.

Pobre Wanessa, não esperava esta atitude. Afastou-se, imediatamente, como um pássaro que busca o seu ninho para se recuperar de um objeto lançado contra ela. Ficou com medo de voltar ao ninho de amor dos dois, optando por um lugar mais distante. Após a discussão, ele achou senhor de si mesmo. Percebeu que estava dando um rumo certo ao seu relacionamento e tinha mostrado a ela suas reais necessidades. Sentia-se confiante.

"Ai de mim..." - disse ele, referindo-se a dor de amor sentida pelos gregos - " Por que fui fazê-lo?". Sabia que tinha ferido o seu amor por uma insegurança que era sua. Cobrou algo que nunca poderia cobrar: afeto. Afeto se dá porque se gosta, e nem sempre dá maneira como acha que deveríamos. Sentiu-se tão pequeno como o inseto que observava na parede. O termo correto seria que ele teria entrado em parafuso por nada. Não sabia como consertar o erro. Não sabia o que fazer.

No amor, em geral, não temos muitas regras. A primeira e mais básica é amar. A segunda é que o amor deve ser sempre cultivado, arado e adubado; mesmo que, para isto, precisemos admitir nossas maiores falhas. E foi o que ele fez: mandou um correio eletrônico esperando que pudesse, através de linhas de choro e tristeza, plasmadas de amor, pudesse arremeter a aeronave que caía por falta de funcionamento adequado.

Esperou duas horas e, após isto, ligou. Wanessa atendeu. Ele pediu desculpas, tentou se explicar. Ela, porém, apenas disse:

-"Sem problemas, eu compreendo. Entendo porque sofre. Eu também; mas, por enquanto, vamos..."

Ele, com medo, a interrempeu:

-"Vamos apenas deixar ser? Sem cobranças? Como a música dos garotos praianos?"

Ela sorriu. Ele tinha entendido, pelo menos a princípio. Somente o tempo diria se ele realmente poderia cumprir. Ela, porém, resolveu apostar naquele adulo de alma de adolescente.

-"Sim... Para que sejamos os adolescentes do início do nosso relacionamento... Onde só havia o desejo de estarmos juntos um do outro."

Ele sorriu. Chorou, também, como toda pessoa para lá de emotiva. Para poder, ainda, se sentir mais aliviado do que tinha dito, mandou-lhe flores do campo. O perfume delas tinham um quê do perfume que ela utilizava. Ela mandou uma mensagem pelo celular dizendo o quão feliz ficou por receber tal mimo e que, no próximo encontro, iria levar-lhe uma surpresa especial... Era só ele esperar.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Oswaldir

Oswaldir sentia falta de sua amada. Ela preenchia cada pequeno vazio de seu ser, permeando cada célula do seu ser. A ausência que sentia dela era por demasiada longa: tudo o que poderia acontecer na sua vida era nada em relação ao desejo que pulsava por sua amada. Buscava, em vão, estudar. Conseguia se concentrar por meia hora e voltava a pensar nela. Era como se o estudo conseguisse bloquear parte da falta que ele sentia dela e que este mesmo estudo pudesse, de algum jeito, trazê-la mais para perto do seu cotidiano.

Resolveu, então, dar uma volta. Caminhava e observava o seu bairro. Conseguiu não pensar nela por alguma hora inteira, quase. Correu mais um pouco, para que pudesse extravasar parte de sua pulsão, porém era maior do que se pudesse percorrer mil léguas. Decidiu, então, voltar para casa e tomar um longo banho quente. Após dele sair, escutou um barulho vindo de seu celular. Era ela, era o barulho só dela que ele tinha colocado no seu celular para que pudesse saber quando vinha de sua amada.

Dizia: "Estou com saudade e desejo... Advinha por quem? Rs. Bjs". Sorriu. Ela não era do tipo romântica, do tipo que manda mensagens, do tipo que até se deixar apaixonar e se amar: era uma mulher para se amar por várias vidas, tamanha era a sua complexidade e o gosto que tinha. Seus olhos brilharam mais por lembrar que o encontro dos dois estaria próximo, que ele poderia então dizer tudo o que tinha dentro dele e fazer tudo o que queria dela e com ela.

Resolveu, então, demonstrar o quanto gostava dela. Em uma pequena pausa de estudos, resolveu buscar na internet um texto, para que pudesse homenagear a sua musa. Encontrou um lindo do Fernando Pessoa (acreditava ele que do autor fosse, tal qual a desconfiança na internet por direitos autorais ele possuía) e enviou-lhe. Esperou, uma resposta dela. Sabia que ela estava em uma época desfavorável ao romantismo, mas ele mesmo assim iria esperar por algo.

Escreveu, de uma maneira que ela pudesse ler, o quanto desejava provar do néctar da sua boca, do quanto sentia falta do seu perfume de flores, do quanto sua pele gostaria de estar tocando a pele dela... E do quanto era especial o que tinham, não importavam as desavenças que por vezes apareciam. Ele, estudante de direito, brincava e ria-se com ela de que até mesmo os direitos e garantias fundamentais colidiam-se: o que importava era o princípio da harmonização, pois nenhuma norma era superior a outra. Assim como o bem-qeurer de nenhum dos dois era superior ao do outro: apenas eram duas faces complementares da moeda do amor.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Carmelo

Carmelo recebeu a notícia inesperada agora a tarde, faz pouco tempo. Ele recebeu uma ligação da pessoa especial da sua vida terminando o seu relacionamento com ele. Sempre cordial e aprazível, buscou do âmago do seu ser uma maturidade inacreditável. Orientou-a se era o melhor a fazer ou não, conversou durante algum tempo. Por fim, deu-se por vencido: ela realmente não acreditava tanto no amor deles com a finalidade de pagar para ver.

Desnorteado e chorando, começou a caminhar pelo seu bairro. Em um momento em que pediu a Deus uma iluminação, ele encontrou um templo. Visualizou sua cúpula dourada e sua cor branca, com um jardim na parte da frente. Teve um pequeno soluço e procurou limpar as suas lágrimas. Chegando lá dentro, tomou um copo de água, para se acalmar. Sentou-se em um banco e começou a rezar. Notou algumas pessoas cruzando o corredor, mas não se deu conta de nenhuma delas.

Em dado momento, começou a lacrimar de novo. Olhou para o lado e notou uma mulher, mais alta do que ele e com um rosto fino. Seus cabelos eram longos e encaracolados, lembrando os de um anjo. Sentiu uma paz de espírito ao vê-la. Ela, vendo que ele chorava, apenas sorriu. Ele pediu desculpas. Ela sorriu novamente e lhe estendeu a mão, fazendo um afago. Trocaram algumas palavras e, após isto, foram para a cantina para melhor conversarem.

Conversaram sobre rompimentos, paixões profissionais, interesses... Carmelo se sentiu até bem com aquela conversa. Ela era do tipo espevitada, que consegue animar até uma tarde de velório. Ela o orientou, conversou, acalmou seu coração. Naquele momento, a dor nem era tanta. Agradeceu-a, prometendo um dia retribuir o favor. Ela apenas sorriu complacente e disse para aparecer mais vezes na igreja. Ele, sorriu, pensando que tinha recebido um convite de um anjo. Ou uma anja... Ele nunca soube muito a diferença.

Após a conversa e o incenso queimado, ele começou a se sentir melhor. A sensação de que lhe puxaram um tapete, aos poucos, estava sendo refeita. Caminhava agora pelo seu bairro com uma tranquilidade maior, uma paz de espírito lhe tomou conta de súbito. Observou uma bela árvore e resolveu abraçá-la. Imaginou o que seus amigos do trabalho diriam se vissem aquela cena dantesca: um notório procurador do trabalho fazendo aquela cena.

Ele, porém, decidiu não mais se cobrar. Alejandra estava com ele há alguns anos, mas ela nunca quis firmar um compromisso com ele. Nunca entendera o medo dela de apostar em mudanças, de querer aproveitar a vida ao seu lado. Por um momento, achou que poderia cansar-se disso. Era uma sensação meio ácida em sua boca, a qual ele nunca havia tido. Amava Alejandra de um jeito romântico, típico dos heróis do século XVIII. Tratava-a como uma rainha e dama na sociedade, e de uma maneira mais peculiar na intimidade do casal.

Balançou a cabeça, como se dissesse a si mesmo que ela escolheu o caminho dela. O máximo que poderia fazer era escutá-la, para que pudesse entender o que a levou a tomar tal decisão. Se ela o amava, por que fazer isto? E mais... Se ele era tão especial na vida dela, por que abandoná-lo? Sua cabeça não conseguia entender exatamente o que se passava. Não poderia ser TPM? Ele acreditava que não. Pensou em inúmeros possibilidades, até que se esgotou com o não saber.

"Tudo bem" - pensou, dando de ombros "Ainda darei uma oportunidade de entender tudo o que acabou de acontecer. Afinal, farei isto por amá-la, mas não a tal ponto de continuar ferindo-me a vida inteira." Desta vez, repuxou o canto do lábio esquerdo e arregalou um pouco só o olho esquerdo. Ficou satisfeito com a conclusão a que chegara. Parou em um quiosque e sorveu uma água de coco. Um pouco do centro estava caminhando a passos largos a se reestabelecer. Sentiu-se feliz com isto.

Joelson

Joelson era um cara muito legal. Namorava fazia cinco meses com uma mulher cinco anos mais velha. Conheceram-se, por acaso, em um site de bate-papo na internet. Desde o primeiro momento, sentiram uma química única entre os dois. Conversaram longas horas, dias... Até que finalmente se encontraram. O encontro foi regado a ainda mais charme e conversa, alegria e carícias... Quantas carícias ocorreram naquela noite, quantos beijos, quantos sussurros e juras de desejos.

Este namoro, como tudo o que acontece de repente e com força, também teve alguns altos e baixos. Brigaram, algumas vezes, por coisas poucas. Joelson sempre esteve lá por ela: apoiou-a em seus momentos familiares mais difícieis e em resoluções profissionais. Ela também fazia isto. Estavam apaixonados e isto era tudo o que importava. Um sentia tanta falta do outro que chegava, por vezes, a doer muito no peito. Doía tanto que era bom: consideravam uma dor de amor.

Em uma TPM dela, discutiram longamente a relação. Joelson poderia ser definido como um sujeito maior do que a vida: buscava sempre direcionar os problemas do cotidiano para algo que acontecia dentro da pessoa, mostrando ser um reflexo da própria atitude da pessoa. Interessante ele usar esta exímia habilidade nos outros e pouco nele próprio. Se ele percebesse o que estava por vir, ele com certeza teria se precavido de uma maneira mais própria.

Após uma discussão dos dois e um pedido de tempo por parte dele, ele achou que conseguiria consertar as coisas. Ela não estava lhe dando tanta atenção quanto ele julgava própria e ela estava decidida a não ter cobranças em sua vida, em ficar em uma situação cômoda, um status quo: mesmo que isso significasse que não seria mais feliz ao lado dele. Joelson apostou que a saudade, de novo, poderia reavivar todo aquele relacionamento de maneira mágica. Já havia acontecido uma vez quando ela pediu um tempo (durou apenas cinco dias).

Esperançoso, continuou a fazer o normal: observava a página dela no Orkut para ver se havia algo de novo - sempre combinaram, nestes dois períodos, de não se falarem, mas nada que uma espiadela na página do outro não pudesse gerar um novo alento. Joelson vendo que ela tinha postado uma música sobre o quanto ele fazia falta e o quanto ela queria ligar para ele, teve a certeza de que tinha tomado o caminho certo para poder aprumar o seu relacionamento de novo.

Após três dias, ele recebeu uma ligação. Ela pedia para terminar tudo. Não mais o queria por perto. Choravam, os dois por telefone. Ele, porém, tentou se manter mais firme, dizendo que tudo iria passar e que ambos seriam felizes em um futuro próximo. Ao desligar, chorou copiosamente. Parecia uma criança, ao ser deixada em um ambiente desconhecido pelos pais. Chorava a dor e gritava a sua própria angústia, a sua própria humanidade.

De nada adiantava... Nenhum remédio poderia aplacar o que ele sentia: foi abandonado pelo seu objeto de amor, aquela pessoa que havia feito juras, promessas e amores com ele. Sentia-se fraco, como se algum gênio ruim tivesse passado e levado suas forças embora. Sentia-se só, um vazio, um vazio que somente poderia ser descrito como o solo árido que ansiava pela promessa de chuva... Uma chuva que nunca mais viria para ele. Havia se tornado infértil.

Daiane e o medo

Daiane era uma psicóloga pós-graduado em terapia Cognitivo-Comportamental. Gostava das coisas exatas e preferia que os comportamentos fossem apenas alterados por estímulo-resposta diferenciados, sem precisar desvendar as searas do inconsciente. Sempre ativa, cada vez mais arrebanhava clientes em seu consultório. Tinha um talento especial para o trabalho, chegando sempre de manhã e somente saindo à noite. Trabalhava, além dos dias da semana, o sábado, em meio período.

Em um destes sábados, foi almoçar em um restaurante diferente, tentando mudar o estímulo que costumeiramente recebia do outro chef. Apreciava comidas italianas e o molho ao sugo, acompanhado com uma massa feita no próprio restaurante. Gostou tanto que pediu para mandar os cumprimentos para o chef. Enquanto sorvia seu café, ela percebeu que havia alguém do seu lado. Um rapaz aparentemente novo (ela tinha trinta e cinco e ele aparentava vinte e cinco). Ficou intrigada e olhou-o nos olhos.

-"Olá. Vim agradecer." - disse ele, com um largo sorriso no rosto e olhos brilhantes.

-"Anh... Como assim?" - disse ela, intrigada.

-"Ué... Mandou cumprimentos para o chef. Ele estava ocupado e me mandou agradecer por ele." - fez um pausa delicada - "Mentira... Eu sou o chef. Vim agradecer."

Ela espantou-se com tamanha espontaneidade e presença de espírito. Espantou-se mais ainda com a longa conversa que tiveram. Conversaram sobre trabalho, profissão... Ela ficou ainda mais intrigada ao descobrir que ele tinha cursado alguns períodos de psicologia: gostava de psicanálise. Ela pensou que ninguém no mundo poderia ser perfeito. Ao ser chamado para voltar a cozinha, pois havia aumentado de súbito o movimento, ela saiu.

Ao receber a conta, veio junto uma rosa vermelha e um cartão, com o telefone dele. Ele mandou um outro vazio, dizendo: "Escreva seu nome aqui, já que até o momento eu não sei. E, se possível, um telefone? Adoraria conversar longamente com você." Ela, enrubescida, abaixou a cabeça para que o garçon não a pegasse neste momento de intimidade declarada. Apenas preencheu o papel, deixou o dinheiro e foi embora.

À tardinha, após tomar um vinho e estar em seu sofá vendo um certo seriado de comédia sobre alguns amigos que dividem um apartamento, ela recebeu uma ligação no celular. Era ele. Sorriu, de orelha a orelha, pigarreou para limpar a voz de quem estava morgada no sofá e atendeu. Conversaram mais longos minutos, cada um insuficiente para preencher a necessidade de conhecerem um pouco mais do outro. Marcaram de ir jantar fora, em um local que ele adorava, mas era segredo.

Ele passou para pegá-la mais ou menos às nove horas da noite. Havia dado tempo de fazer tudo aquilo que as mulheres necessitam antes de um encontro, certos rituais longos e dolorosos para que sejam mais atrativas do que já são. Colocou um vestido na altura da perna, preto, com uma sapatilha preta. A bolsa era de um tom violeta, combinando com alguns tons de sua maquiagem. Estava pronta, feliz e, acima de tudo, curiosa.

Foram a um restaurante na praia, meio distante. O medo que sentia por ele ser um maníaco logo caiu por terra ao ver o lugar. Era lindo, aconchegante e muito romântico. Ao sair do carro, fez questão de abrir-lhe a porta. Tocou-a na mão, sem querer. Ela parou. Ele percebeu e olhou-a profunda e ternamente. Ele avançou um pouco e percebeu que ela virou a cabeça de lado, fechando os olhinhos. Foi um beijo... E que beijo. Demorou alguns minutos, enquanto dançavam como dois parceiro antigos em que um já sabia o próximo passo do outro, o que apenas aumentava o prazer. Após o beijo ele disse:

-"Nossa... É sempre assim que beija um estranho? Prazer, Gilmar..."

-"Bobo..." - disse ela, sorrindo toda como uma adolescente apaixonada.

Tiveram um jantar muito aprazível, com ele sempre acarinhando sua mão. A noite, então, dispensaria qualquer comentário. Poderíamos, contudo, para deixar os leitores menos curiosos, que poderia simplesmente ter sido resumido nas últimas partes da música "Valsinha", de Chico Buarque. Muito mais aumentada e intensa do que a já linda letra deste poeta.

Namoraram durante dois anos, até que Daiane vacilou algumas vezes sobre a certeza daquela relação. Ele andava ocupado com a expansão de um novo restaurante e ela cobrava mais tempo dele. Ela própria, então, resolveu pedir um tempo para reavaliar o que estava acontecendo na sua vida. Ele, cabisbaixo e entristecido, apenas concordou. Ela estava muito preocupada: queria ter filhos, mas não sabia se era com ele.

Nesta uma semana que se passou, ela apenas sobreviveu. Chorou, se amaldiçoou... Até que se acalmou. Ela, já pela terça-feira, quando achava que tinha colocado a cabeça em ordem, começou a perceber uma coisa. Seu mundo estava menos colorido, meio desbotado. As músicas só serviam para lembrar dele e do seu lindo amor. Atordoada, procurou comer algo... Insosso. Tudo parecia ter perdido a graça. Ela, porém, resolveu continuar na sua vã tentativa de resistir.

Já no sábado, quando não aguentava mais, sentiu seu corpo clamando pelo dele. O cheiro dele vinha em sua cabeça, uma pequena peça pregada pelo seu centro límbico. Tudo e mais do que tudo lembrava-o. Tinha um peso no seu peito, como se uma garra envolvesse seu coração, pressionando-o tanto que gerava uma dor. Uma dor imensa, terrível... E chorou como uma criança. Chorava e soluçava pela falta daquele homem que resolveu desistir de tudo aquilo.

Ela pegou o celular. Teve medo que ele não atendesse, que ele não mais a amasse, que ele já a tivesse esquecido... Temorosa e arrasada, ligou. Conversaram, com aquele pé atrás natural no casal. Até que, em um dado momento, ele soltou um chiste típico dele, o que na hora acionara o mau humor dela e depois ela pediria desculpa. Ela apenas sorriu... E disse:

-"Nunca senti tanta falta dessas suas bobagens" - e sorriu. E lhe agradeceu pelo seu amor.

Na noite daquele mesmo dia, duas coisas aconteceram. Eles continuaram a sua bela história de amor, com direito a um lindo buquê de rosas colombianas dado por ele. No final do jantar, ele pegou em sua mão e se ajoelhou em sua frente. Puxou uma pequena caixa preta de jóias e mostrou-lhe o anel de noivado que havia comprado no mesmo dia em que ela pedira o tempo. Em meio a lágrimas, os dois de felicidade, ela aceitou aquele pequeno presente. Graças a isto, temos a pequena Manuella, como prova de que nada é tão impossível assim... Basta apenas se ter fé: em si mesmo e no seu parcerio.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Astolfo e Marialva

Astolfo estava lembrando, nesta tarde, como ele gosta de Marialva. Chamava-a simplesmente de Alva, pois assim era a sua pele. Alva também era a sua atitude perante a vida, sempre cheia de amor e compreensão pelo ser humano. Seu cheiro era o de flores do campo, dando ainda mais suavidade a um rosto firme, porém cheio de carisma. Seus olhos eram o que mais impressionava Astolfo: pareciam dois poços de petróleo, sempre valiosos e também voláteis.


Tinham um bom relacionamento: estavam juntos há pouco mais de dois anos. Ambos trabalhavam e eram competentes profissionalmente, cada um em sua área: ele, um arquiteto em franca ascensão, e ela era uma já mais solidificada engenheira. Conheceram-se em um congresso patrocinado pelo CREA-RJ. No almoço, sentaram ocasionalmente ao lado um do outro. Ela, com sua melhor amiga e ele, com seu melhor amigo. Um buscava ver o outro enquanto o outro não estava percebendo.

Ao final do congresso, de novo ocasionalmente se encontraram na saída. Nenhum dos dois tinham ido de carro e chovia muito. Ele fez sinal para o táxi e, ao perceber que ela esperava um, iria cedê-lo para Alva. Ela sorriu e perguntou se não teriam a sorte de ir para o mesmo lado. Ele, meio enrubescido, falou que iria para a zona sul. Ela também. O bairro era o mesmo. Sorriram-se e foram conversando no meio do caminho.

No próprio caminho, devido ao tamanho engarrafamento, resolveram parar e comer em algum lugar. Comeram pizza (que ela até hoje adora, especialmente fria, no café-da-manhã) com um vinho espumante tinto, escolha de Astolfo. Ele sabia, de algum jeito, que ela gostaria do vinho. Quando Astolfo foi lhe servir mais, ela tocou de leve a sua mão. Os dois pararam e somente os olhos se buscavam. Um oceano de sentimentos foi derramado entre eles.

Beijaram-se, de leve, como se quisessem descobrir um ao outro. Estranho foi como suas bocas se encaixaram de maneira precisa e eficaz. O beijo quente e molhado dela era absorvido pela boca dele. Trocavam os papéis durante aquele enlace. Ruborizaram-se ao ver que haviam constrangido um casal de senhores na mesa ao lado. Riram-se deles mesmos e foram para a casa de Astolfo.

Foi uma noite mágica e inenarrável para ambos. Fizeram tudo aquilo o que aquela recém-intimidade permitia que fizessem. Foram ousados, em alguns aspectos, coisas típicas dos amantes certos que se encontram. Riam, dizendo que eram do mesmo planeta, por gostar muito da arte de amar. Ele virou-se e disse apenas fauno. Ela riu, tocou seus lábios com o dedo indicador da mão direita e lhe disse fauna.

Não pararam de se amar todo este tempo. Porém, nem tudo são flores. Mal sabia Astolfo que, ao pedir um compromisso mais sério, teria colocado Alva em uma posição difícil. Ela não contara para ele a história de que havia sido abandonada no altar. O noivo havia optado por ficar com uma namorada anterior a ela. A casa, as mobílias, tudo foi vendido e dividido. Alva não queria saber mais de compromissos sérios.

Discutiram aquela noite. Expuseram, um ao outro, seu ponto de vista. Astolfo, enfim, tomou a decisão mais difícil: resolveu deixar Alva refletir sobre tudo aquilo. Ela, chorosa, pegou suas coisas e saiu de seu apartamento. Para dormir, o vinho foi sua companhia. Riu da ironia de que teve que tomar a garrafa do espumante preferido dela para poder cair nos braços de Morfeu. Sentido, acordou o dia seguinte com aquela típica ressaca dos Diabos.

Resolveu, então, caminhar um pouco. Andou, correu e chorou um pouco. Tomou sua média, pão na chapa e suco de laranja no barzinho que tanto gostava. Ao chegar em casa, olhou o celular, procurando alguma ligação, algum sms, algum e-mail... Não tinha nada. Resolveu não ficar em casa. Tomou banho e foi ao supermercado.

No meio do caminho, ao ligar o rádio, escutou a música que ela uma vez tinha lhe mostrado. Falava do quanto ela precisava dele naquele momento, do quanto ela temia que não fosse importante para ele, do quanto gostaria de ligar para ele, ... Amaldiçoou o destino por um segundo, depois sorriu: se a música dizia isto, quer dizer que havia uma possibilidade da sua mulher fascinante ligar para ele. Ele iria esperar, então, com sua típica ansiedade que se mostra através de sua gastrite. Iria esperar porque sabia o quanto ela era especial para ele e se, ele fosse metade do quanto ela significa para ele, ela iria ligar. Ele iria esperar o tempo dela, como um cavalheiro.

Lisandro e Berthonia

Lisandro era o típico bom rapaz de vinte e cinco anos. Estudioso tardio, embora brilhante, tinha ingressado na faculdade de engenharia e era um aluno para lá de promissor. Era um bom filho, sempre respeitador dos limites impostos pelos pais e sempre atento a conversar com eles. Um bom amigo, sempre disposto a escutar. Nos relacionamento, era um excelente amante.


Padecia, porém, de um mal comum em todos os seus relacionamentos: não sabia estabelecer os limites necessários. Tinha um grande medo de perder as pessoas, impondo algumas coisas que não queria ou não podia fazer. Se pegássemos todos os seus relacionamentos anteriores, veríamos que a culpa principal era dele, sendo por demais permissivo.

Na faculdade, sempre era quem fazia o trabalho do grupo. Em seu estágio, resolvia o problema dos outros também. Até que, um dia, ficou encantado por uma engenheira da empresa. Ela era cinco anos e cinco meses mais velha do que ele. Seu nome era Berthonia; seu pai era Bernardo e sua mãe era Anthonio, como ele descobriria mais tarde.

Ele, pouco a pouco, usava desculpas para estar perto daquele fascinante mulher: conservava a beleza de sua adolescência, matizada por traços seguros trazidos com a idade. A certeza no que fazia profissionalmente apenas o encantava mais e mais. Tinha um humor ácido, inteligente e rápido. Ele, porém, estava enlouquecido por descobrir outras qualidades que ela teria.

Ela o percebia, também de maneira gradual. Um rapaz brilhante, dotado de uma inteligência e carisma impressionante. Achava-o um menino, mas quando o ouviu falando sobre a vida, achou-o um homem feito. Espantava-se com tantas qualidade que apareciam e, principalmente, com o seu bumbum lindo. Ela enrubesceu uma vez em que admirava uma de suas partes preferidas quando ela quase a pegou. Admirava também o fato de usar óculos: achava um charme à parte.

Ela estava desejosa por uma oportunidade de conhecê-lo melhor. Arrumou um almoço com um cliente para conversar sobre um projeto. Após conversarem e o cliente ir, ficaram mais uma hora conversando. Resolveram marcar um café, mais tarde. O café da tarde virou jantar que, por sua vez, se concretizou em uma maravilhosa noite de amor. O menino havia surpreendido a mulher em como era dedicado na cama. Era carinhoso, levando o café-da-manhã e acordando-a com beijos no pescoço e poesias sussurradas ao pé de seu ouvido.

Não assumiram um compromisso, porém nenhum dos dois saía mais com ninguém. Ele a conquistava dia-a-dia, com pequenos sms, e-mails e toda forma de carícia. Ela sentia-se seduzida e retribuía na mesma moeda. Algo, porém, estava prestes a acontecer. Ela começava a se perguntar se aquele menino poderia ser o pai de seus filhos. Achava-se velha e queria ser mãe o quanto antes: sabia que a gestação poderia ser difícil, apesar dos inúmeros avanços da medicina nesta área.

Ele não entendia o distanciamento que, levemente, acontecia. Resolveu intensificar seu romantismo, sem sucesso. Conversaram algumas vezes, tentando chegar a uma conclusão. Lisandro, confuso e cheio de dor, resolveu dar o passo que não queria. Pediu para que terminassem, para que ela pudesse avaliar o que queria fazer. Ela foi pega de surpresa; achava que o amor dos dois havia acabado. Ele reiterou que não, que apenas fazia isto porque a amava demais. Amava-a tanto que desejava passar a vida inteira do lado dela. Ela, contudo, teria que decidir.

Decidiram não mais se falar. Ele foi estagiar em outro setor da empresa. No dia seguinte a esta decisão, Lisandro sofria. Pegou-se, várias vezes, com a mão no celular pronto para lhe ligar. Quando via um e-mail da firma com o nome dela, sentia uma palpitação no peito. Sofria por amor. Quase ligou para ela quando, no final do dia, sentiu o cheiro do perfume preferido dela no corredor. Sabia que ela havia passado por ali. Isto tudo ocorreu só no primeiro dia.

Viveria uma angústia por tudo isto. Sabia, entretanto, que valeira a pena cada esforço que desse na direção de concretizar sua relação com ela (seu maior desejo) ou não; amava-a tanto que gostaria que ela tomasse a melhor decisão para ela, sem que ele pudesse pressioná-la com o seu romantismo, os seus carinhos; com o seu amor.

Cada vez que seu corpo gritava a ausência do corpo dela, cada vez que ele lembrava que adorava brincar com seus negros cabelos sedosos, cada beijo no pescoço, cada jura de amor feitas no meio da conjunção do dois: tudo isto serviria de força para que suportasse a dor que sentia. Sabia que deveria se sacrificar no altar do amor para obter o que desejava. Lembrou de seu pai lhe explicando o que era sacrifício – vinha do termo sacro e ofício, ou seja, ofício sagrado. Sorriu, olhando para o celular, esperando uma ligação. Iria esperar o tempo necessário pela certeza do seu amor.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Joelmo e seu Concurso

Joelmo vivia a expectativa de sua vida. Era um rapaz sonhador, passional e sempre buscou algo melhor para ele em sua vida. Desejava, do âmago do seu ser, se tornar parecido com seu pai: um homem honesto, trabalhador e que vivia exclusivamente para a sua família. Sua mãe era a mulher mais feliz do mundo, sempre acarinhada por um homem bom e disponível para seus filhos. Incentivava-os a crescer, tanto em estudo quanto em caráter.


Nosso protagonista, então, seguiu o mesmo caminho. Teve algumas decepções em relações a escolhas profissionais, mas agora realmente tinha se aprumado na vida. Estava cursando direito e se preparava para um concurso público de segundo grau. A escolha veio depois de um concurso ter sido frustrado por motivos alheios a sua vontade. Desta vez, prometeu ele a si mesmo, desta vez iria dar certo.

Estudava dia e noite, deixando de lado amigos e família. Sacrificava-se para que pudesse alcançar uma oportunidade melhor: sentia-se velho, já com seus trinta anos. Questionava-se se podia ser a metade do homem que seu pai é. Sentia-se, de certo modo, pressionado por ter um exemplo tão correto e bondoso de ser humano dentro de casa. Resolveu, então, apostar em si mesmo, uma única vez.

Sabia que a decisão de estudar oito horas por dia, no mínimo, era radical. Tinha tomado esta atitude baseado na solidão que sentia em sua vida, uma sensação de estar vivendo a sua vida pela metade. Não mais queria se sentir incompleto, queria se tornar o protagonista de sua própria vida. Era raro isso acontecer em sua vida: normalmente, era vacilante e reticente em suas escolhas, sempre buscando caminhos difíceis e respostas fáceis.

Sua resposta, agora, não seria nada fácil. Seria dura, dando o seu sangue e todo o seu emocional para que pudesse prosseguir. Seus dias seriam cheios de intempéries, com direito a duvidar de si mesmo, de ser o seu próprio antagonista. Era ele quem, em primeiro e último lugar, seria quem poderia levar-lhe aos louros da glória ou ao poço sem fim da derrota. Viveria esta batalha interna a cada dia.

Cada folha que lesse, cada pequeno exercício resolvido... Tudo isto seria o balizador para sua vida. “Vou triunfar” – prometia-se a cada exercício feito, a cada dúvida. Chorava, por vezes, a solidão que os estudos traziam-lhe. Não se deixou abater no início: prosseguiu, com passos curtos e firmes, até que pudesse correr de novo. Acreditava em si mesmo e dali não haveria mais retorno.

Uma semana antes da prova, já exausto e bitolado em certo ponto, seu cérebro levou-lhe, de súbito, ao passado. A um namoro que teve com Carmina, uma linda e apaixonante adolescente. Eles tinhas quinze anos, sua primeira vez tinha sido com ela. Achava-a fascinante, e ela era. Ela também o achava assim. Ele a perdeu por não confiar nele mesmo. Lembrou-se que, em dado momento do relacionamento deles, ele havia cedido. Ela, então, pouco a pouco, foi deixando-o de lado. Chorou muito por isto.

De volta para o presente, sorriu. Um sorriso gostoso, daqueles de quando a ficha cai. Sempre deixou que as mulheres fizessem dele gato e sapato, mas tinha percebido o quão especial era: era um homem e tanto, apenas buscando o seu caminho profissional. Lembrou do quão especial todos achavam que ele era, inclusive seus mais próximos amigos. Admiravam o seu jeito espontâneo e meio moleque. Isto contrastava com a sua profundidade de ser humano e o quanto sabia tratar de modo adequado e aprazível outro ser humano.

Suspirou e sorriu de novo, espreguiçando-se. Lembrou rapidamente de todas as suas ex-amantes e decidiu, firme, que também levaria o seu relacionamento baseado na certeza do quão especial era. Não deixaria, contudo, do seu amor deixar de ser belo e puro; muito pelo contrário, continuaria sendo quem ele é. Só que, agora, quem em sua totalidade era: confiaria em si mesmo para tomar as atitudes, por mais complexas e dolorosas que fossem. Sabia que, no final, valeria a pena por saber a verdade.

Abreu e seu dilema

Abreu era um jovem bem atípico para a sociedade moderna. Acreditava no amor e no ser humano. Gostava de pensar que as pessoas eram boas por natureza e que apenas quando se sentiam fracas, faziam mal a alguém. Poderíamos chamá-lo de sonhador. Um sonhador romântico, acrescentaria. Namorava apenas uma mulher de cada vez: preferia provar várias vezes a mesma do que uma vez várias. Este é o nosso nobre herói, em poucas palavras.

Abreu estava namorando Myllena. Ele, um romântico e ela, uma pessoa absolutamente racional. Era engraçado ver os dois juntos. Compartilhavam várias características em comum, destoando gravemente somente nesta. Enquanto ele lembrava as datas comemorativas, mandava-lhe flores e escrevia-lhe cartões, ela os recebia e, por vezes, até retribuía. Quando estavam sós, na intimidade, porém tudo se acertava. Estas intimidades eram poucas, dadas as vidas profissionais de cada um: ele, um engenheiro, ela, uma autora de romances.

Pode parecer estranho, mas era exatamente isto. Enquanto Myllena usava Abreu para suas inspirações em seus livros, Abreu a usava para poder sair dos cálculos de estruturas. Abreu gostava de sair para comemorar as datas, sempre sabendo que ela não lembraria. Mas Abreu estava ficando cansado: um dia inteiro havia tentado falar com ela, sem sucesso algum. Isto seria normal, ambos estavam, por vezes, acostumados a esta rotina. Ele, porém, percebia que algo estava se partindo.

Sentia, pouco a pouco, seu amor ir se escoando. Era como se ele doasse e não recebe uma outra via. Deixava, por muitas vezes, de lado para que esta situação não atrapalhasse o casal: contudo, estava começando a atrapalhar o seu cotidiano. Vivia preocupado, sem deixar transparecer. Naquela, noite, iria conversar com Myllena sobre tudo o que estava passando pela sua cabeça. Iria ser claro como um rio límpido, se tivesse tal coragem.

Ao pegá-la em sua casa, conversaram amenidades. Ele não conseguia disfarçar a sua ansiedade e ela percebia que algo estava errado. Após alguns minutos, houve aquela pausa constrangedora. O silêncio imperava no ar, denso como argamassa. Ela, apertando as suas pequenas e delicadas mãos uma contra a outra, fez a fatídica pergunta:

- " Aconteceu algum pra você estar chateado?"

Ele suspirou fundo, balançando a cabeça duas vezes de um lado para o outro e soltou o ar. Falou para ela tudo o que o estava angustiando, com parcimônia e calma. Dizia que se angustiava pela falta que ela fazia na sua vida: o fato de poucas vezes conseguirem dormir juntos, o fato de se falarem mais por telefone do que pessoalmente, o fato dela ter deixado de mandar os sms bonitos que mandava no início da relação. Ela ouvia tudo, com os olhos marejados.

Ao acabar de falar tudo, Abreu observou os olhos de Myllena encherem de água e, uma lágrima, escorrer do seu oho esquerdo. Ela olhava para ele com sofreguidão. Ele encostou o carro. Ela pegou na mão dele, como se fosse um tesouro precioso, algo que nunca antes ele havia encontrado em toda a sua vida. Ele se sentiu acalentado e culpado por tudo aquilo. Ele tentou contornar a situação puxando a conversa de novo:

- "Desculpe... " - dizia ele - "Eu não queria..."

Ela, gentilmente, colocou o dedo indicador de sua mão direita sobre os seus lábios.

- "Você disse tanto... E eu, sempre tão pouco. Desculpe por ser assim, mas tenho tanto medo de me machucar de novo. Você é muito especial, Abreu. Eu não mereço uma pessoa que tenha tamanha dedicação por mim. Sei que ando ocupada com o trabalho; este lançamento do livro é importante para mim. Você acha que também não penso em você? A grande vantagem minha é que cada personagem masculino que encanta as personagens femininas do meu livro são inspirados em você. Na sua doçura, na sua gentileza... Olha, adorei que tenha se aberto comigo assim, viu? Mas... Posso fazer uma sugestão?"

- "Pode." - disse ele, com remorso e esperança

- " Nunca deixe chegar a esse nível de angústia, viu? Isto é só coisa da sua cabeça, seu bobo. Aliás, a minha sugestão é a seguinte: vamos deixar de lado o jantar e ir comemorarmos o nosso aniversário de namoro em algum outro lugar mais particular? Sabe aquele corpete com cinta-liga que tanto gosta? Estou com ele hoje." -disse, passando as unhas de leve por cima de sua mão direita - "Que acha de ver se é verdade o que estou dizendo?" - disse, sorrindo a malícia dos amantes.

Abreu sorriu. Ficou aliviado que ela tenha aceitado tudo de uma maneira tão leve e de uma maneira tão gratificante para a relação dos dois. Deixou escorrer uma lágrima, também, tamanha a emoção. Beijou-a, nos lábios de leve e abraçou-a forte, expressando todo o carinho e amor que um homem pode ter pela sua mulher amada. Ficou poucos segundos que pareceram momentos infinitos de eternidade. Após isto, os dois inclinaram a cabeça, com os olhos entre-abertos, olhando-se em suas janelas da alma. Deram-se outro beijo e sorriram. Eram duas crianças para lá de felizes e entregues a sua própria fantasia romântica.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Joanice

Joanice, ou Jô como preferia ser chamada, estava passando por um momento muit difícil na sua vida. Tinha percebido que havia realizado escolhas na sua vida que estavam lhe trazendo muita dor. Sua profissão estava de pernas para o ar e a sua vida pessoal não poderia ser chamada muito bem de vida: não tinha nenhuma. Afundava-se em trabalho para poder esquecer o Cavalo de Tróia que tinha aceitado em sua vida no passado.

Chorava, vez por outra, mas somente por dentro. Desde que tinha ocorrido a abertura do Cavalo e sua cidade havia sido dominada, nem na hora que encerrou o relacionamento com o seu ex-marido. Ele havia contrariado todos os juramentos feitos diante do celebrante: "Amar e respeitar" - todos os outros ela suportaria. O que não suportou foi a traição velada que ele realizara: deixou-a de lado, aos poucos, como se fosse apenas um cd do qual gostamos muito e só vemos sua capa, nunca o tocamos.

Quando sua vida parecia se normalizar, com o trabalho tomando conta de sua vida, sua empresa decidiu lhe dar férias. Tinha duas acumuladas e não desejava pagar por elas. No primeiro dia, ficou dentro de casa, de um lado para o outro. Ligou a tevê, o rádio, tentava ler um livro e cozinhar: tudo ao mesmo tempo. Não queria ouvir a voz de sua própria consciência.

Alguns dias depois, encontrava-se triste. Ela lembra muito bem daquela quinta-feira de manhã. Era fria, com o sol se escondendo atrás das nuvens. Ela caminhava pela rua, procurando um bistrô para comer, quando parou em frente a uma loja de roupas. Olhava, distraidamente os sapatos, quando deu de frente para si mesma. Olhou dentro de seus olhos e, por incrível que pareça, lágrimas rolavam por sua face.

Envergonhada por isto, tentava se conter, sem sucesso. Buscou um templo religioso, qualquer que fosse, para poder ter um pouco de privacidade. Achou um. Sentou em seu banco, sem em momento algum, deixar de escorrer lágrimas por sua face. Estava triste, só não sabia exatamente com o quê. Tentava se recompor, numa vã possibilidade de re-enterrar todo o seu passado. O Inconsciente, porém, é caprichoso: nos avisa através de pequenos sintomas no corpo, tal como atopicidade ou gripe que algo não anda bem. Quando deixamos estes sintomas de lado, outros surgem - até o momento da Revelação.

Flashes passavam pela sua cabeça e ela não conseguia apertar o botão de pausa, para que pudesse lembrar das cenas. Ficou assim por, ao menos, uma hora. Após estar exausta de tanto chorar, algo aconteceu. Não como nas novelas ou em livros, com cores e formas ou até em filmes com cenas marcantes, luzes impressionantes... Ela se sentiu tocada por algo maior do que ela mesma, como se tivesse sido levada para uma montanha e visto a paisagem do seu passado.

Com isto, aos poucos, foi conseguindo obter o controle de sua respiração de novo. Aos poucos, foi observando todos as mazelas que ela própria tinha deixado acontecer na sua vida. Ela ia, de pouco em pouco, separando o joio do trigo do passado. Percebeu que ela própria tinha feito tudo, até mais do que o necessário, para poder ter salvo o seu casamento. Balançou a cabeça, como que se estivesse afastando de sua própria cabeça de que a culpa seria exclusivamente sua.

Deu um sorriso de canto de boca e movimentou a cabeça, instintivamente, para cima. Abriu os olhos aos poucos e sentiu ainda mais paz no seu peito. E um pensamento veio em sua cabeça, de uma maneira repentina, mas concatenado: "Meu Deus, obrigada por todas as oportunidades que me deu para aprender. Eu me perdôo por tudo o que deixei que me causassem, mas a partir de agora, desejo caminhar com esta paz que eu sinto. Desejo mudar tudo, de agora em diante, passo-a-passo. E assim vou continuar porque sei que toda a dor para mudar, será compensada com o amor por mim mesma e, assim, poderei me abrir para o amor de outra pessoa."

Ficou ainda mais um tempo saboreando aquele doce gosto de satisfação em sua boca, aproveitou para limpar o rosto. Pegou seu espelho de bolsa e olhou-se, feliz. Passou o batom e sentiu-se mais viva, como se tivesse deixado uma bola de aço para trás. Ela libertou-se de sua própria prisão que havia construído para não se perceber como a mulher fascinante, inteligente, bem-humorada e bonita que era. Sentiu-se ainda mais bonita com tudo aquilo. Resolveu sair de lá e aproveitar o dia, como um pássaro que acabado de dar seu primeiro vôo para fora do ninho.

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Prazer.

Estamos em nosso próprio universo, onde o tempo e o espaço em nada podem interferir. Neste nosso universo, onde só cabe a mim e a ti, podemos estar entregues um ao outro da maneira mais pura e bela. Observo-te, deitada, encantando-me com teu charme, fitando-me com teu olhar, desejosa que eu me aproxime. Tuas órbitas oculares me chamam para dançar, e eu, feliz e contente, humildemente ofereço-me para tal tento.


Toco o teu corpo de uma maneira carinhosa, o qual fica retesado com a mera aproximação da minha mão. Percebo o teu riso, de satisfação, um riso matreiro de uma mulher que irá ganhar o melhor presente que pode-se esperar de alguém: um amor sem restrições, sem pudores. Após percorrer teu corpo com a minha mão, encosto meus lábios em tua pele. Sinto os teus pelo se ouriçando, e escuto um leve arfar saindo de tua boca. Sem precisar olhar-te, percebo o prazer exalar de teus poros.

Deito-te, em nosso leito nupcial. Percorro cada local, com atenção e zelo, não importa o quão recôndito ou inóspito ele seja. Toda pequena parte do objeto de prazer que me é oferecido merece ser explorado da mesma maneira: apaixonadamente, com improvisações em tudo o que já foi feito, apenas para poder aumentar a tensão que já é quase insuportável entre nós dois separados um do outro.

Ao terminar isto, toco os meus lábios nos teus e a minha língua encontra a tua. Se queríamos dançar, agora só esta parte dos nossos corpos conseguem saciar esta sede. Da saliva, dos músculos se encontrando, do fervor, de tudo aquilo em que até Cronos perderia a noção de tempo e Morfeu nunca pensou em imaginar algo do gênero, surpreendo-te.

Adentro o teu inferno com firmeza. Ao iniciar este processo, vejo que faço você sair do Purgatório da nossa vida cotidiana e alcançar um pedaço do céu. Estamos juntos, ligados por uma ponte do prazer que não tem prazo para terminar. Exercemos nossas habilidades de tentarmos unir nossos corpos sem pressa.

Variamos nossos lugares de amantes e o modo como podemos fazer o nosso pequeno ritual. Enquanto as areias do tempo humano escorrem, tocamos nossas almas com a mesma delicadeza que de um sorriso que nos é dado. Isto, porém, também é insuficiente para podermos satisfazer nossos impulsos. Trocamos juras de amor, sussurramos palavras excitantes e também tentamos falar coisa que não conseguimos, balbuciamos meras palavras tamnha é a volúpia ali instituída e aumentada.

Após um pedido teu, feito entre dentes, quase que lânguido pelo esgotamento de energia, fazemos aquilo que tanto gosta. Coloco-te, de uma certa maneira, em submissão. Deste jeito, o nosso amor pode fluir de maneira ainda mais incontida. Faço tudo aquilo que se é permitido fazer com a pessoa amada. A tua retribuição são os já conhecidos e, ainda assim, surpreendentes jeitos de mostrar-te o prazer que lhe proporciono. A isto, também não resisto, e derramo-me em ti.

Não que seja o fim de tudo... Isto é apenas o início, o aquecimento de nosso amor. Acarinhamo-nos, um ainda preso ao outro, sentindo apenas que o mundo parou. Sorrimo-nos, com a inocência de duas crianças. Apreciamo-nos, como uma obra-prima composta por um gênio. Ali, naquele espaço, no nosso espaço, podemos ser aquilo tudo que temos medo de ser fora dali: nós mesmos. Aceitamo-nos como somos, tudo aquilo que somos. E isto só da margem para mais e mais prazer.

domingo, 4 de julho de 2010

Ataíde e Patriccia

Ataíde tinha acordado cansado naquela manhã de domingo típica de um inverno. Ao levantar-se de sua cama, olhou para o lado e percebeu que sua amada não estava mais ao seu lado. Demorou, aos poucos, tanto pelo sono quanto por não querer lembrar, que ela havia viajado para um Congresso de Medicina. Imediatamente a isto, veio em sua cabeça a discussão que eles tiveram antes dela viajar.


Não havia tido ofensas por nenhuma das partes; sempre se respeitavam. Mais do que isto, chamavam a si mesmos de amantes, mesmo com um relativo tempo de relacionamento. Mais do que isto: prometeram sempre, um ao outro, sempre serem amantes, não importando qual passo da relação mais a frente seria tomado.

Aí residia a questão do relacionamento deles. Ele, um promissor estudante de direito e concurseiro e ela uma médica já realizada na sua profissão. Ele tinha cinco anos a menos do que ela; não que isto importasse um para o outro: importava para ela a vontade que tinha de ser mãe. Ataíde, por sua vez, conversava com Patriccia sobre isto, vez por outra, quando o inconsciente dela trazia a questão à tona. Sexo, amor, companheirismo e conversa eram a base do relacionamento deles, variando de posição dependendo da necessidade do casal.

Eles prometeram não se falar neste ínterim. Queriam aprofundar o relacionamento, levá-lo um passo a diante. Isto, porém, deveria ser dado baseado na falta que o amor de um pelo outro causasse, não simplesmente por uma mera necessidade de se ter alguém – não que fosse o caso – mas Ataíde queria ter certeza de que Patriccia iria tomar sua decisão pautada exatamente sobre este critério: o da felicidade pessoal dela, em primeiro lugar.

Ele, então, decidiu caminhar naquela manhã. Tinha por hábito fazer isto quando precisava juntar os quebra-cabeças de sua vida. Tomou um suco e foi andar. O vento frio, misturado com a luz do sol o fez lembrar dela. Nada que fosse muito diferente, tudo fazia lembrar dela. Ao caminhar, percebeu a marca que ainda tinha em seu braço que ela havia feito fazia uma semana.

Era o polegar dela. Ela o havia marcado em uma tórrida noite de amor, em um descontrole causado pelo prazer que ele proporcionou a ela; um dos inúmeros daquela bela tarde em que comemorou o seu aniversário com ela. Ela, tímida após sempre repetir o mesmo ato, se desculpava. Ele, sorrindo como uma alvorada, dizia que adorava o descontrole dela pelo simples fato de se entregar totalmente a ele, sem pudores.

Algo que ele nunca disse é que o fato de marcá-lo era apenas mais uma maneira dele tê-la em seu dia. Além da mente, tomado pelas doces e inteligentes palavras, o coração era dela também, especialmente o Ventrículo Esquerdo. Mas quanto mais, melhor, pensava Ataíde. O seu próprio corpo era o templo de amor dela e ele gostava que a sua deusa, musa inspiradora, deixasse claro que ali era somente o reduto dela.

Abriu um sorriso de canto de boca, típico que ela fazia quando ficava tímida após confissões amorosas realizadas por ele. Parou a caminhada, olhou para cima e desejou que ela pudesse ler os seus pensamentos de alguma maneira. Alguma maneira que não conseguisse burlar a regra estipulada por eles (nunca foram bons nisso, a ansiedade de ambos sempre debelava estas regras sobre afastamento e futuro do casal).

Ele queria ter uma forma de magia, de canto, de poesia que pudesse dar a ela a certeza do quão especial e importante ela era na sua vida. Por isto, a colocava em primeiro lugar no relacionamento deles, porque ela também o colocava. Ele, sorrindo com aquele amor imenso que tinham um pelo outro, resolveu esperar. Iria ser paciente como os sábios e lembrou-se de duas coisas muito importantes que aprendera em sua meninice.

A primeira é que lembrou de um ditado que dizia que um homem estava decidindo que estrada tomar para que pudesse resolver a maior questão de sua vida.Resolveu, então, tomar o caminho menos usado, o mais ousado. Foi difícil no início, mas ele percebeu que era o melhor caminho para ele, pois os desafios encontrados recompensavam-no com tesouros ainda maiores a serem descobertos.

A segunda delas é que o amor é como um pássaro, devendo deixá-lo livre para que possa voltar ao seu ninho. Ela era sua pequena borboleta, que trazia-lhe a esperança de que cada dia seria melhor do que o anterior. Valia a pena esperar por ela, mesmo que fosse um éon de espera. A eternidade seria pouco para que ele pudesse desfrutar do que ela poderia oferecer para ele, através da sua própria escolha de felicidade. Paciente, sorriu de novo, com esperança no que poderia acontecer.

sábado, 3 de julho de 2010

Manuel Arthur e Antônia

Manuel Arthur era um sujeito um tanto quanto composto. Em seu parco entendimento lingüístico, preferia ter nascido apenas com um nome, para que pudesse ser mais simples. Ora ele agia como Manuel, ora ele agia como Arthur. Por uma destas coincidências do destino, trabalhava na área de relatórios revisionais e críticas. Seu trabalho consistia em, basicamente, apenas apontar erros e qualidades. Porém, como em quase tudo em sua vida, ficava indeciso e nunca fazia um fechamento, apontando um direcionamento.


No campo do amor, então, teríamos que falar que ele tratava a si mesmo como um verbo intransitivo, incapaz de se relacionar com o seu objeto direto de desejo, invariavelmente nem mesmo caindo no campo do amor platônico. Achava-se por demais simplório em suas concepções de vida: trabalhar para sustentar sua família, ser fiel a sua esposa e também amá-la intensamente. Adicionaríamos a ela, o seu desejo intrínseco de ter filhos. Para ele, era simplório para toda e qualquer mulher um homem destes.

Estranhos e curiosos são os caminhos de nossa vida. Estranho e curioso também seria o de nosso intrépido anti-herói. Em uma destas segundas-feiras, em que não esperamos nada do trabalho, foi realizada uma avaliação 360 graus no seu setor de trabalho. Manuel, claro, não pestanejou e classificou tudo como sempre costumava: buscando anular uma característica boa a uma característica ruim, a fim de retratar que todos eram neutros.

Uma semana após este fato, foi chamado pela chefia de Recursos Humanos. Só havia ido lá por dois motivos: ser contratado e assinar suas férias. Temia, com isto, que sua avaliação foi tão mal realizada que sua demissão seria o caminho. Respirou fundo e, sentindo-se mais uma vez um agente da passiva, como se sentiu em relação a toda a sua vida, caminhou até a recepção dos Recursos Humanos. Esperou, pacientemente, pois a secretária havia informado que a diretoria ainda deveria chegar.

Quando a diretoria chegou, ele a viu somente representada na figura mais bela da mais bela das mulheres que ele já havia visto em toda a sua vida (sim, com mais figuras de repetição e sentimentos superlativos que este pobre narrador poderia ter). Sua tez era branca, harmonizada com a cor de cacau que fluía de suas madeixas. Seus olhos eram negros como a noite e enigmáticos como o oceano iluminado pela lua. Suas curvas somente poderiam ser descritas como de uma bela região montanhosa e perfeita. Tudo isto estava envolto em um belho vestido lilás, com um sapato marrom e uma bolsa da mesma cor.

Sentiu-se menor ainda por ter uma mulher como aquela perto dele. Ela entrou em sua sala. Esperou alguns minutos e o chamou através da secretaria. Manuel tremia feito uma vara verde, mas decidiu respirar fundo e tentar se tornar um sujeito de sua própria vida. Mas, desta vez, ele desejava que pudesse ser um sujeito ativo, cheio de predicativos.

Ao sentar-se, a diretora (chamava-se Antônia) perguntou para ele o motivo de ter feito uma avaliação tão meticulosamente equilibrada. Sentiu um nó na garganta e tentou abrir os lábios. Não conseguiu. Respirou fundo e lembrou-se de sua aula de português. Lembrava que o presente era o lugar do sujeito e deveria usar isto para basear suas escolhas. O passado iria ocorrer assim que ele falasse e, do futuro, nada podia esperar, somente um futuro daquele mesmo presente que ele estava construindo naquele momento.

Com isto, discursou de maneira magnífica sobre como poderia ser bom analisar as coisas de maneira tão analíticas. Admitiu, contudo, pequenos erros e os atribuiu ao stress que gerava fazer avaliações. Revelou, ainda, que estava desejoso por poder contribuir mais para a empresa e que também desejava algo maior para sua vida do que passar dez anos no mesmo setor.

Antônia espantou-se, nunca alguém havia sido tão sincero e tão aberto. Admirou-o por isto. Começaram a conversar sobre amenidades também, uma longa conversa. Um saborosa conversa sobre preferências musicais, gostos por vinhos, literatura e por uma infinidade de assuntos. Riram-se e divertiram-se muito deles mesmos. Até que entraram em um assunto delicado.

Sim, caros leitores, a vida amorosa. Conversaram muito. Ela admitiu que sempre se sentia uma agente da passiva, deixando-se levar por homens que nunca a mereceram. Ele, por sua vez, admitiu que sentia-se também agente da passiva, com algumas vezes tendo se sentido um mero verbo de ligação para o sujeito principal da oração amorosa: a outra mulher que, de vez em quando, ficavam com ele.

Os dois, após um pausa de identificação e timidez típica de duas pessoas que se identificaram, resolveram continuar a conversa no almoço. E depois, em um outro almoço. Começaram a se encontrar tanto e de tantas maneiras que sua história de amor começou a ser escrita pelos dois, mas de uma maneira tão bonita e tão sincera que tornavam-se cada vez mais desejosos um do outro.Cada um, ao seu tempo, tinha virado o sujeito principal e ativo de suas vidas, porém, decidiram compartilhar todos os seus verbos de modo recíproco e não mais receptivo. Amaram-se e casaram-se. E, quando se travava de objetos diretos, poderíamos dizer que “eles tiveram quatro filhos”.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Akino e Bee

Akio era um pequeno goblin. Era verde, tinha olhos negros e sua baixa estatura, vez por outra, o fazia motivo de chacota por outras criaturas daquela pequena floresta. Ele era um goblin de bom coração: gostava da natureza e preservava suas boas amizades. Gostava de cativar as outras pequenas criaturas mágicas que tanto tornavam sua vida feliz. Tinha ele se acostumado a viver como um bom vivant e pouco se importava com o amanhã; ele nunca havia lido o conto da cigarra e da formiga.


Um dia, uma pequena graça ocorreu no seu dia. Ele encontrou um pequeno filhote de unicórnio fêmea, a qual chamou de Bee. Ela havia se tornado a razão de todo o seu viver. A princípio, ele era um pouco raquítica e era meio desengonçada enquanto criança. Aos poucos, o seu tratador e seu melhor amigo forneceu carinho e boa alimentação para que ela se desenvolvesse.

Passavam dias inteiros juntos, Akio escrevia para ela poemas e sonetos. Tudo o que ele tinha, dedicava a ela, até as horas do seu sono. Gostava de velar o sono de Bee, acariciando as suas crinas negras e deslizando a sua mão pela face daquele unicórnio fêmea. Unicórnios crescem não só a base de alimentação, mas principalmente de amor. Akio ansiava para que Bee crescesse rápido, para que pudessem se aventurar para além da pequena floresta. A pequeneza dela havia, pouco a pouco, infectado o pequeno goblin; sentia-se menor do que ele próprio, fato que Bee sempre tentava negar, devolvendo-lhe o afeto dado por ele.

Porém, em uma certa noite, Bee fora vítima de uma grave moléstia. Seu chifre, fonte de todo o seu poder mágico que já se mostrava imenso, começou a apresentar uma coloração estranha. Akio ficou preocupado; conhecia pouco sobre unicórnios e menos ainda sobre as doenças que os acometia. Ficou preocupado. Procurou, então, entre as criaturas mágicas, como poderia fazer para salvar a sua companheira de longa data.

Foi orientado por uma Pixie que deveria procurar um velho mago que morava ao Leste da floresta. Uma travessia de três dias. Ele arregimentou suas próprias forças e arrumou uma pequena mochila com mantimentos para a viagem. Uma lança para defendê-los de alguma outra criatura que pudesse atacá-los. Assim, com esperança de que tudo desse certo e medo do que poderia dar errado, ele partiu em sua busca.

A travessia, em si, nem fora tão perigosa. Ao chega na velha choupana do mago, Akio teve uma surpresa. Era uma aprendiz do antigo mago que estava lá. Ela explicou para ele que o ancião havia ido atender um pedido do rei dos anões e por isto não estava ali presente. Um nó firmou-se na sua garganta, que foi medianamente dissolvida com as palavras suaves da doce aprendiz.

-“Escute com atenção, pequeno goblin...” – fez isto enquanto olhava cuidadosamente o chifre de Bee – “Este unicórnio tem um laço muito especial com você. Ter chegado até aqui não foi o mais complicado, mas o que vem a seguir o é. Deverá ir na montanha mais alta do pico nevado e encontrar uma erva vermelha, em formato de coração. É dela que precisarei para cuidar de sua amada companheira. Está pronto para isto?”

Um calafrio percorreu a espinha de Akio. Ele nunca havia feito nada tão perigoso e, por seu descuido, Bee havia contraído esta grave moléstia. Ele não sabia o que fazer, nem se deveria confiar na aprendiz. Decidiu, por bem, deixar Bee para que ela cuidasse. Sabia que ela não agüentaria a viagem que poderia possibilitar a sua reabilitação. Tinha medos e angústias, todas refletidas nos seus pequenos joelhos que tremiam.

Perguntou a aprendiz, com os olhos cheios de lágrima, se ela poderia administrar a situação até que ele obtivesse o fôlego necessário para que pudesse prosseguir em sua tão arriscada jornada. A aprendiz sorriu, disse que ele deveria confiar nele mesmo e que iria fazer de tudo para que Bee ficasse viva para que pudesse receber o bálsamo. O pequeno goblin, então, olhou para Bee.

Contemplou todos os seus medos, o medo de perdê-la, o medo de não se sentir merecedor de um ser mágico tão especial. Estava destruído por dentro, arrasado por todos os sentimentos desesperançosos que se pode haver. Chorava copiosamente a dor de poder perder alguém tão especial. Enquanto suas lágrimas se derramavam, algumas escorreram pelo chifre afligido pelas chagas. Algo aconteceu.

Seu sofrimento e angústia pelo amor que possuía por Bee deram uma outra cor ao chifre. Originalmente era branco e havia ficado negro com as chagas; agora, havia tornado-se cinza. A aprendiz o congratulou por demonstrar seu amor verdadeiro e que, pelas lágrimas derramadas, ele havia conseguido o tempo necessário para realizar a sua empreitada. E que, dali por diante, deveria provar que era merecedor do vínculo de amor que havia estabelecido com Bee.

Ele encheu seu peito de esperança de novo. Havia sido renovada toda a sua força para que pudesse trilhar este caminho novo, esta nova aventura, para que pudesse restaurar tudo o que o unicórnio era para ele. Sabia que precisaria voltar o mais rápido que pudesse com o bálsamo, para que o unicórnio finalmente pudesse se desenvolver em sua máxima plenitude, desabrochando uma magia nunca antes vista naquele século.
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