domingo, 9 de maio de 2010

Anthonio e Kelly

Anthonio tinha acordado diferente naquela manhã chuvosa. Sentia que o seu amor por Kelly tinha se esvaido um pouco naquela noite, como os pingos da chuva que escorriam pela a sua janela. Levantou-se para observar o tempo lá fora e viu o céu cinza, típico desta época fria do ano. Sentiu os dedos dos seus pés frios e resolveu colocar um par de meias para poder aquecê-los. Enquanto sentava na sua cama, pensou naquele sentimento que o incomodava.


Não tinha motivos para estar daquele jeito. Tinha uma relação estável com sua amada e tinham tido uma maravilhosa conversar telefônica no dia anterior. Entendia que ela tinha passado por uma semana difícil e que não queria compartilhar certos problemas com ele, mas ele a tinha apoiado em todo o processo, sempre de maneira gentil, como um verdadeiro companheiro. Toda dúvida que ele poderia ter se as questões eram com ele caíram por terra.

Eles riram muito ontem. Lembraram de uma festa elegante na qual tinham ido e que ela tinha colocado vários docinhos em um copo descartável para levarem para casa. Riu do seu jeito de criança naquela hora. Riu mais ainda quando Kelly confessou que em sua infância sempre ia às festas de aniversário com o mesmo macacão verde, o qual era provido de muitos bolsos, e colocava vários docinhos ali dentro, conseguindo melecar completamente a vestimenta.

Lembrou então, naquele momento, quando se surpreendeu quando ela buscava um programa de tevê com desenhos animados, parando quando viu um certo desenho de um certo cachorro falante. Seus olhos brilharam, como se fosse uma moleca, e começou a rir e comentar o desenho com ele. Enquanto esta cena vinha à tona, soltou um "Hum" de satisfação. Kelly tinha parado de falar e perguntou o que havia acontecido. Ele respondeu:

-"Lembrei daquele dia em que assistimos desenho animado juntos. Foi interessante ver como uma mulher perspicaz e séria como você se permite assistir desenhos como se fosse uma pequena infante... Agora que me falou do macacão verde, cheguei quase a ver você usando ele naquele dia. A minha menina-mulher fascinante que sabe exatamente a hora de ser uma coisa ou outra. Uma qualidade admirável, sabia?"

Naquele exato momento, sentiu um pequeno vazio. Percebeu que a tinha deixado envergonhada - ruborizada, como ela preferia - e imaginou a cena que contemplou tantas vezes acontecendo naquele momento. Ela estava enrubescida, abaixou um pouco a cabeça. Agora seria a hora em que ela iria sorrir, puxando o cantinho direito da boca pra cima. Seus olhos iriam descer cortinas até a metade, fechando um pouco as suas janelas da alma. Sua mão direita provavelmente tinha se retraído um pouco.

Ele resolveu mudar de assunto e conversaram sobre mais amenidades. Terminaram o telefone fazendo juras de amor um para o outro. Não entendia como podia achar que estava sentindo menos por ela. Resolveu, então, tomar um banho para comprar o que faltava para fazer o seu almoço. Ligou o chuveiro bem quente, tentando mais uma vez afastar o frio.

Sua cabeça começou a passar outro filme, enquanta ensaboava seu corpo. Lembrou das travessuras que faziam debaixo do chuveiro, de sua mulher agindo de uma maneira sedutora, rindo naquela espiral gostosa que ele tanto apreciava. Começa em um tom baixo e ia subindo, aos poucos, até que terminava com um "hum", como se ali ela soubesse que tinha o domínio sobre toda a situação e sobre o seu corpo.

Após se enxugar, resolveu fazer a barba bem devagar. Queria saborear todas aquelas lembranças que não paravam de lhe inundar e, ao terminar, passou o perfume que ela tanto gostava como se quisesse atraí-la. Desejou que ela estivesse no seu quarto naquele momento para que pudesse ver se "Estava cheiroso o suficiente" como ela gostava de dizer, insinuando-se sobre o seu corpo e o cheirando. Por vezes, dava até uma mordidinha em seu pescoço.

Mas ela não estava lá. Sorriu, meio que de tristeza, ao constatar a cama vazia. Enquanto aprontava-se para ir ao supermercado, pegando sua blusa, percebeu que algo havia caído no chão. Era o primeiro cartão escrito por Kelly. Pegou-o e começou a admirar a sua letra. Era redondinha e bonita, parecendo um caderno de caligrafia. Seu "m" parecia um pequeno coração e sua fluência na língua o deixava sempre admirado por aquela mulher tão especial que tinha aparecido em sua vida.

Colocou o cartão de lado, apoiou os cotovelos em suas coxas e encostou a cabeça nas suas mãos. Suspirou profundo agora, sentindo falta dela. Tinha descoberto ali, naquele momento, que não é que seu amor por ela tinha diminuído. A falta dela por uma viagem urgente de trabalho é que lhe doía, incomodava não saber quando iriam se rever para que seus corpos pudessem se entrelaçar.

Riu de seu pensamento ao acordar, riu de uma maneira quase debochando de si mesmo, de sua ignorância. Ao rir, escutou um barulho tocar. Era o seu celular. Tinha recebido um bonito SMS de sua amada; ela deveria vê-lo agora, completamente ruborizado. Resolveu responder a ela, de uma maneira tão romântica quanto. Ao acabar de digitar, seus olhos ficaram marejados, emocionados com tudo aquilo. "Agora..." - disse ele para si, segurando o aparelho - "... só me resta esperar a mais doce solidão. E como é bom poder esperar por ela." Sorrindo de felicidade e saudade, enviou o seu torpedo.

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