quarta-feira, 14 de julho de 2010

Theobaldo e o dia chuvoso

Theobaldo era um bom rapaz. Prestativo, estudioso e trabalhador. Acrescenteríamos boa praça, sempre com um largo sorriso e uma mão amiga. Ele buscava sempre ser maior do que ele mesmo. Estava, porém, atrevessando um momento para lá de difícil: tinha almejado algo oneroso demais para si em um relacionamento. Acreditava que poderia ganhar. Infelizmente, não foi isto o que aconteceu. Sentia-se só e com pouca esperança.

Sentou no chão do seu quarto, chorando baixinho. Desejava com toda a força que a dor passasse, que o sentimento que o estava consumindo por dentro saísse do seu peito. A dor parecia um cão faminto, que rosnava para quem se aproximasse e impedia de ser tirado dali. Entre lágrimas e soluços, conseguiu se arrastar até o chuveiro. Ligou a água quente e sentou-se no chão do box. Ficou ali por vários minutos, incontáveis minutos de sofrimento.

Chorou tudo o que podia. Enxugou-se e, ao ir em direção a pia do banheiro, olhou-se no espelho: via toda a sua dor e desesperança estampadas. Não sabia o que fazer. Voltando ao seu quarto, decidiu folhear alguma coisa. Abriu um livro e leu algo lindo: "Não importa o que aconteceu. Importa o que você vai fazer com o que você deixou que acontecesse". Lembrou-se das aulas de filosofia, de Hegel, de tudo o que ele falava sobre a sua forma de pensar.

Sorriu. Não lembrava quando tinha sorrido nas últimas horas, mas este sorriso teve um gosto de certeza, de um caminho que deveria ser trilhado: a opção já havia sido dada pela sua ex-companheira, a opção de que ele não mais faria parte da vida dela. Sentou-se na cama e pensou na mulher fascinante que tinha perdido. Quase ia começar a chorar de novo, quando lembrou-se de algo: ela também estava perdendo aquele homem fascinante, romântico...

Lembrou-se de todas as vezes que conversaram sobre filhos, sobre futuro, sobre casamento; lembrava do quanto ela sorria de quando falavam de sua filha, a qual ele graciosamente tinha aceitado o bonito nome que ela havia oferecido a ele. Lembrou de todos os bons momentos de intimidade sexual que tiveram. Lembrou do quanto ela tinha dito que homem nenhum a havia fascinado daquele jeito e nem a satisfeito daquele jeito. Lembrou-se também das brigas, as pequenas asperesas ditas por eles ao tentarem satisfazer a tensão do amor que sentiam um pelo outro.

Suspirou fundo e sorriu. Algo dizia para ele que era definitivo a atitude que ela tinha tomado. Já ensaiaram essa valsa umas duas vezes, mas agora ele tinha a certeza. Ela estava esquisita a semana toda, raramente o chamando de amor: o que ela adorava fazer, puxando o "r" do final da palavra. Lembrou-se do gosto do seu beijo, do seu cheiro, do seu toque... De tudo o que um fazia com o corpo do outro. Lembrou-se dos diálogos inteligentes e de tudo o que tinha acontecido com eles no tempo em que estavam juntos.

Ele lembrou-se de como orientou a auto-estima dela profissional e pessoal. Ela afirmava sempre que era a mulher mais feliz do mundo ao seu lado. Ele sentia-se feliz com isto e, de certa maneira, não acreditava que conseguia realizar isto. Ela o fez um homem mais seguro, mais alerta... E ela o havia amado. Disso ele tinha certeza, assim como ele a tinha amado. Mas a história tinha acabado, pelo menos entre eles dois.

Olhou pela sua janela e viu o tempo chuvoso, triste... Como se todas as lágrimas dos deuses chorassem pelo fim de um amor tão puro, genuíno e verdadeiro. O mar batia suas ondas, como se até Netuno não acreditasse nisto. Pan, o rei dos faunos, chorou por ver seus dois filhos se separem e decretou que não mais haveria festa naquele dia. Tudo isto, tudo isto pelo que havia cindido neste dia.

Ele, por sua vez, sentiu-se abraçado pelo mundo, como se algo maior, como se a própria vida estivesse lhe oferecendo a mão e um ombro amigo para que ele pudesse transpor os momentos de dor pelos quais ele passaria. Sabia que passaria. Sabia, contudo, que também teria os seus momentos de felicidade. Seriam menores, no início, mas sabia que eles iriam chegar. Ele esperaria pacientemente por eles, como quem espera a primavera dos frutos. E ele, então, iria saboreá-los.

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